Um corvo, um cobre

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sexta-feira, 20 de março de 2009

BORGES E EU


Jorge Luis Borges


Vou manter a minha paz em algum lugar distante de você. Assim deve ser. Vou procurar no sossego do jardim, o bucólico cheiro de jasmim... Engano-me, bem sei, mas, por alguns instantes, jaz em mim a saudade antiga e dominante, que me abarca e me leva pra longe, vagando por outros céus, além dos cumes de inalcançáveis montes. Sentar-me-ei à sombra convidativa de um salgueiro e lerei nos compridos versos de Borges sobre a solidão ampliada nos espelhos e desse jeito tranqüilo aquietarei o tigre em minha mente... Penso em um tigre ao modo de Borges, tal como penso nas adagas, nas Bibliotecas, no Aleph e num velho poeta cego que um dia andou pelo campo de Castela... Perdida, na vastidão de seu mundo multiplicado, o dia correrá mansamente por dentro de mim...

sexta-feira, 13 de março de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-CINZENTO ENTARDECER











CINZENTO ENTARDECER


Era uma tarde viúva, de véu cinza e escuro manto
De feio semblante
Não havia o brilho, nem a quentura do sol
Não havia o frio, nem as gotas de chuva

Pensei num poema
Olhei em volta
Mas, a tarde viúva não me comoveu
Era um sonho, uma quimera...
Desfez-se... com o escuro da noite que logo desceu


sábado, 7 de março de 2009

O GIGANTE EGOISTA




Um conto de
 Oscar Wilde
Tradução de Oscar Mendes


Todas as tardes, ao regressar da escola, costumavam as crianças ir brincar no jardim do Gigante.
Era um jardim amplo e belo, com um macio e verde gramado. Aqui e ali, por sobre a relva erguiam-se lindas flores como estrelas e havia doze pessegueiros que na primavera floresciam em delicados botões cor-de-rosa e pérola, e no outono davam saborosos frutos. Os pássaros pousavam nas árvores e cantavam tão suavemente que as crianças costumavam parar seus brinquedos, a fim de ouvi-los.
 “Como somos felizes aqui!”, gritavam uns para os outros.
Um dia o Gigante voltou. Tinha ido visitar seu amigo o Ogre de Cornualha e ali vivera com ele durante sete anos. Passados os sete anos, dissera tudo quanto tinha a dizer, pois sua conversa era limitada, e decidiu voltar para seu castelo. Ao chegar, viu as crianças brincando no jardim.
— Que estão vocês fazendo aqui? — gritou ele, com voz bastante ríspida e as crianças puseram-se em fuga.
— Meu jardim é meu jardim — disse o Gigante — Todos devem entender isto e não consentirei que nenhuma outra pessoa, senão eu, brinque nele.
Construiu um alto muro cercando-o e pôs nele um cartaz:


É PROIBIDA A ENTRADA

OS TRANSGRESSORES SERÃO PROCESSADOS


Era um Gigante muito egoísta. As pobres crianças não tinham agora lugar onde brincar. Tentaram brincar na estrada, mas a estrada tinha muita poeira e estava cheia de pedras duras, e isto não lhes agradou. Tomaram o costume de vaguear, terminadas as lições, em redor dos altos muros, conversando a respeito do belo jardim por eles cercados. “Como éramos felizes ali!” diziam uns aos outros.
Depois chegou a primavera e por todo o país havia passarinhos e florinhas. Somente no jardim do Gigante Egoísta reinava ainda o inverno. Os pássaros, uma vez que não havia meninos, não cuidavam de cantar nele e as árvores esqueciam-se de florescer.
Somente uma bela flor apontou a cabeça dentre a relva, mas quando viu o cartaz, ficou tão triste por causa das crianças que se deixou cair de novo no chão, voltando a dormir. Os únicos que se alegraram foram a Neve e a Geada.
— A primavera esqueceu-se deste jardim — exclamaram — de modo que viveremos aqui durante o ano inteiro.
A Neve cobriu a relva com seu grande manto branco e o Gelo pintou todas as árvores de prata. Então convidaram o Vento Norte para ficar com eles e o vento veio. Estava envolto em peles e bramava o dia inteiro no jardim, derrubando chaminés.
— Este lugar é delicioso — dizia ele — Devemos convidar o Granizo a fazer-nos uma visita.
De modo que o Granizo veio. Todos os dias; durante três horas, rufava no telhado do castelo, até que quebrou a maior parte das ardósias e depois punha-se a dar voltas loucas no jardim, o mais depressa que podia. Trajava de cinzento e seu hálito era frio como gelo.
— Não posso compreender por que a Primavera está demorando tanto a chegar — disse o Gigante Egoísta, ao sentar-se à janela e olhar para fora, para seu jardim frio e branco.
— Espero que haja uma mudança de tempo –
Mas a Primavera nunca chegou, nem tampouco o Verão. O Outono deu frutos áureos a todos os jardins, mas ao jardim do Gigante não deu nenhum.
— É demasiado egoísta — disse ele.
De modo que havia sempre Inverno ali e o Vento Norte, e o Granizo, e a Geada e a Neve dançavam por entre as árvores.
Uma manhã jazia o Gigante acordado em sua casa, quando ouviu uma música deliciosa. Soava tão docemente a seus ouvidos que pensou que deviam ser os músicos do Rei que iam passando. Era na realidade apenas um pequeno pintarroxo que cantava do lado de fora de sua janela, mas já fazia tanto tempo que não ouvia ele um pássaro cantar em seu jardim que lhe pareceu aquela a mais bela música do mundo. Então o Granizo parou de bailar por cima da cabeça dele, o Vento Norte cessou seu rugido e delicioso perfume chegou até ele pela janela aberta.
— Creio que chegou por fim a Primavera — disse o Gigante, saltando da cama e olhando para fora. Que viu ele?
Viu um espetáculo maravilhoso. Por um buraco feito no muro, as crianças tinham-se introduzido no jardim, encarapitando-se nas árvores. Em todas as árvores que conseguia ver achava-se uma criancinha. E as árvores sentiam-se tão contentes por ver as crianças de volta que se haviam coberto de botões e agitavam seus galhos gentilmente por cima das cabeças das crianças. Os pássaros revoluteavam e chilreavam, com deleite, e as flores riam, apontando as cabeças por entre a relva. Era um belo quadro. Apenas em um canto ainda havia inverno. Era o canto mais afastado do jardim e nele se encontrava um menininho. Era tão pequeno que não podia alcançar os galhos da árvore e vagava em redor, chorando amargamente. A pobre árvore estava ainda coberta de geada e neve e o Vento Norte soprava e rugia por cima dela.
— Sobe, menino! — dizia a Árvore, inclinando seus ramos o mais baixo que podia. Mas o menino era demasiado pequenino.
E ao contemplar o Gigante aquela cena seu coração enterneceu-se.
— Como tenho sido egoísta — disse. Agora estou sabendo por que a Primavera não vinha cá. Vou colocar aquele pobre menininho no alto da árvore e depois derrubarei o muro e meu jardim será para todo o sempre o lugar de brinquedo para os meninos.
Sentia-se deveras muito triste pelo que tinha feito. De modo que desceu as escadas e abriu a porta de entrada bem devagarinho, saindo para o jardim. Mas quando as crianças o viram, ficaram tão atemorizadas que saíram todas a correr e o jardim voltou a ser como no inverno. Somente o menininho não correu, pois seus olhos estavam tão cheios de lágrimas que não viram o Gigante chegar. E o Gigante deslizou por trás dele, apanhou-o delicadamente com a mão e colocou-o no alto da árvore. E a árvore imediatamente abriu-se em flor e os pássaros chegaram e cantaram nela pousados e o menininho estendeu seus dois braços, cercou com eles o pescoço do Gigante e beijou-o. E as outras crianças, quando viram que o Gigante já não era mau, voltaram correndo e com eles veio também a Primavera.
— O jardim agora é de vocês, criancinhas — disse o Gigante, que pegou um grande machado e derrubou o muro. E quando as pessoas iam passando para a feira ao meio-dia, encontraram o Gigante a brincar com as crianças no mais belo jardim que jamais haviam visto. Brincaram o dia inteiro e à noitinha dirigiram-se ao Gigante para despedir-se.
— Mas onde está o companheirinho de vocês? — perguntou — O menino que eu pus na árvore?
O Gigante gostava mais dele porque o havia beijado.
— Não sabemos — responderam as crianças.
 — Foi-se embora — Devem dizer-lhe que não deixe de vir amanhã — disse o Gigante. Mas as crianças responderam-lhe que não sabiam onde ele morava e nunca o tinham visto antes. E o Gigante sentiu-se muito triste.
Todas as tardes, quando as aulas terminavam, as crianças chegavam para brincar com o Gigante. Mas o menininho de quem o Gigante gostava nunca mais foi visto de novo. O Gigante mostrava-se muito bondoso para com todas as crianças, contudo tinha saudades do seu primeiro amiguinho e muitas vezes a ele se referia.
— Como gostaria de vê-lo! — costumava dizer.
Os anos se passaram e o Gigante foi ficando muito velho e fraco. Não podia mais tomar parte nos brinquedos, de modo que se sentava numa grande cadeira de braços e contemplava o brinquedo das crianças e admirava seu jardim.
— Tenho belas flores em quantidade — dizia ele, mas as crianças são as mais belas flores de todas.
Numa manhã de inverno, olhou de sua janela, enquanto se vestia. Não odiava o Inverno agora, pois sabia que era apenas a Primavera adormecida e que as flores estavam descansando. De repente, esfregou os olhos, maravilhado, e olhou e tornou a olhar. Era realmente uma visão maravilhosa. No canto mais afastado do jardim via-se uma arvore toda coberta de alvas e belas flores. Seus ramos eram cor de ouro e frutos prateados pendiam deles e por baixo estava o menininho que ele amara.
O Gigante desceu as escadas a correr, com grande alegria, e saiu para o jardim. Atravessou correndo o gramado e aproximou-se da criança. E quando chegou bem perto dela, seu rosto ficou vermelho de cólera e perguntou.
— Quem ousou ferir-te? Pois nas palmas das mãos da criança viam-se as marcas de dois cravos e as marcas de dois cravos nos pequeninos pés.
— Quem ousou ferir-te? — gritou o Gigante — Dize-me, para que eu possa tirar minha grande espada e matá-lo.
— Não — respondeu o menino — São estas as feridas do Amor.
— Quem és? — perguntou o Gigante, sentindo-se tomado dum grande respeito e ajoelhando-se diante do menininho.
E o menino sorriu para o Gigante e disse: — Tu me deixaste brincar uma vez em teu jardim, hoje virás comigo para o meu jardim, que é o Paraíso. E quando as crianças chegaram correndo naquela tarde, encontraram o Gigante morto sob a árvore toda coberta de alvas flores.

— Fim —


Fonte: WILDE, Oscar. Obra Completa. Organização, tradução e notas de Oscar Mendes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1995.

sexta-feira, 6 de março de 2009

LUAR PELA FRESTA






É noite! Há uma fresta em meu telhado por onde a lua me espia 

Demoro-me um tanto a espiá-la também Ligo a TV. 

Leio um pouco. 

Repouso. 

Desacelero o coração 

Rabisco palavras no papel, linhas ilegíveis de um pretenso poema, mas sou surpreendido com a queda de uma estrela, que, suavemente, passa pela fresta e inunda de luz o meu pensar.

Bom sinal! 

Quem sabe meu sonho se torne real? 

Assim como a lua e a estrela, o sol e a chuva entram pela fresta também 

E me acalentam e me dão de beber. 

Alimentam-me com novas palavras, muitas idéias... 

E com elas construo um castelo, um novo universo 

Renovo o discurso 

Refaço o verso.

segunda-feira, 2 de março de 2009

DESENHO DE GIZ








A chuva cai e apaga da calçada o desenho de giz que eu fiz, parece-me que há muito tempo, em uma outra vida, quando ainda era feliz.

Era um desenho de giz tão bonito, alegre, colorido... que, quem o via não pensava em o apagar e até mesmo as crianças ficavam encantadas e, em outra calçada, iam brincar.

Mas a chuva, que de nada se compadece, veio e borrou minhas esperanças, levando embora na enxurrada o desenho de giz, desfeito em água...

E minhas lágrimas foram tantas que competiram com a chuva...


domingo, 1 de março de 2009

SERENATA SELVAGEM








Os gatos debaixo do meu telhado
Os gatos em cima de minha janela
Os gatos em cima de meu telhado
Os gatos debaixo de minha janela
Oh cantoria maluca
Que não me deixa dormir
Lá fora
Os gatos no cio
Os gatos vadios
A noite escura é o seu cobertor, o manto protetor, a cama macia para o aconchego do amor
Nos longos gemidos emitidos por necessário capricho
O sossego humano perturbar
O bicho vai pegar
É hora de acasalar
A serenata selvagem corta o silêncio da noite
E não há água, pedrada ou sapatada que os espantem rua afora, se por perto houver uma gatinha manhosa e formosa, toda prosa
Cheia de amor pra dar
O bicho vai pegar
Os gatos debaixo do meu telhado
Os gatos em cima de minha janela
Os gatos em cima de meu telhado
Os gatos debaixo de minha janela
Alta madrugada
Lá fora
Os gatos no cio
Os gatos vadios
O sossego humano perturbar o bicho vai pegar
E hora de acasalar

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-ÁRIA DE CARNAVAL


ÁRIA DE CARNAVAL

Paris das Selvas, Carnaval de 1915.

Em verde cidade, em verdes anos, bailam foliões ao som de antigas marchinhas.
Belos carnavais de outrora!
Dentro e fora dos salões, a mascarada se anima. Afinal, é carnaval, é pierrot, é serpentina! Fantásticas cores, leves balanços.
Ao longe passam arlequins e colombinas, travando inocentes guerras de confetes, enchendo a rua de pontos coloridos, transformando as calçadas em adoráveis campos de batalhas.
Mas, também são verdes os olhos do ciúme, e observadores, na figura de Diana, se deleitam. Os tristes olhos que a deusa vigiam, guardam nos lábios palavras de queixas.
É a doce Ária
1, adolescente ainda, que de deusa Diana se fantasia e do Olimpo desce para entre os mortais vir brincar, e nem percebe os tristes olhos frios, que de longe a vigiam, e feliz corre para seu novo par.
Tantos planos, tantos sonhos, para depois do carnaval. Por ora, só o baile é importante, a correria no salão é contagiante e todos esperam a aurora raiar!
Porém, eis que os acordes mágicos de um violino interrompem a brincadeira e os foliões, embevecidos, param, ao ouvirem a canção.
É Ária, que em seu violino toca uma valsa - talvez um presságio! ''Subindo ao Céu'', ela toca, quando um tiro é disparado!
O amor e harmonia que a melodia espalhava, são logo substituídos por confusão e espanto! E o baile, antes tão colorido, cinza torna-se!
Ária cai com o violino, deixando no ar os últimos acordes; de vermelho vivo se tinge o vestido e a tristeza, com seu manto, a todos envolve.
O novo par de Diana, na figura de um caçador, a arma dispara; na luta que trava com o oponente sofredor.
O tiro mortal a disputa encerra, pois a causa, jaz, estendida no chão!
Agitam-se os foliões e o leve corpo carregam, formando estranho cortejo!
A partitura fora rasgada, para sempre, calou-se a cantiga. Não é a deusa Diana, ''a caçadora'' quem nos braços carregam, mas sim, a doce Ária já sem vida!


1Ária Ramos era uma jovem violinista de dezessete anos da sociedade manauara. Foi morta num baile de carnaval, por um tiro disparado por seu namorado que usava uma fantasia de caçador. Dizem alguns que tal tiro foi acidental. A arma disparara durante uma briga do rapaz com o ex-noivo da moça. Outros dizem que não houve briga nenhuma, e até hoje permanece um mistério o motivo de sua morte.



Do livro MORONETÁ-Crônicas Manauaras; Virgínia Allan, Editora Valer

domingo, 22 de fevereiro de 2009

EM TEMPOS DE CARNAVAL, VAI, ME TOCA UM BLUES...


Em tempos de Carnaval, prefiro escutar um blues... há irrealidade nesta festa profana, há tristeza profunda nesta “alegria barata”. Billie Holliday me invade os ouvidos, enquanto o vizinho ao lado escuta uma velha marchinha... bom, meus vizinhos são das antigas e ainda brincam o Carnaval de um modo antigo, mas prefiro a tristeza intraduzível, desprovida de máscaras de minha querida Billie... não estranhem se pareço intimo assim... me sinto intimo, um membro da grande família do Blues. Carnaval nunca me deu sossego... é barulho pra todo lado e não consigo me afastar de toda essa bagunça... não dá... faz parte de nossa cultura, faz parte de nossa história... Hum, devo admitir, faz parte de mim, mas eu, como “bicho” urbano, não agüento a solidão de um sitio afastado. Pobre de mim... Fico assim... Nem lá nem cá... Aproveito para escrever e ler... em momentos de descuido, mergulho em breves devaneios... Meus devaneios, às vezes, são temáticos e como estamos no Carnaval, viajo de volta a um passado romântico, onde os personagens estão sempre felizes. É Carnaval, não pode ser diferente e esta alegria é real, embora brote de um sonho. Na minha passarela desfilam as belas morenas, os passistas de outrora, o imenso Rei Momo, Chiquinha Gonzaga, com seu “Abre Alas”, Pixinguinha, Noel Rosa, Cartola e toda a Velha Guarda da Mangueira, Adoniran Barbosa, Lamartine Babo, Ary Barroso, Carmem Miranda... e há também “o pirata da perna de pau, do olho de vidro, da cara de mau”; a loirinha dos olhos claros de cristal”... “a nêga maluca”... e por aí afora, são tantos brincantes importantes... e há, ainda os carros enfeitados, o folião misterioso sob a Máscara Negra, o Arlequin desencantado, a Columbina ingrata e o alegre Pierrot e “é tanto riso, tanta alegria, mas de mil palhaços no salão”... Contudo, embora sejam belíssimas histórias, hoje não vou junto neste compasso... vão eles passando, desfilando sob uma chuva de confetes e serpentinas, bailando e cantando antigas marchinhas... desfilam ao som das maravilhosas orquestras, do delirante frevo, das barulhentas batucadas... Os sons e os ritmos se misturam, se confundem numa orgia de cores e sabores, afinal é Carnaval... Entretanto, a nostalgia não me abala e permaneço firme, sem vergar a alma e ouço apenas a voz inconfundível de Billie, que me invade os sentidos... Em tempos de Carnaval, prefiro escutar um blues... VAI, ME TOCA UM BLUES.
..

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-E O ASSUNTO AGORA É CARNAVAL?



Para Clarice

Então Clarice, o assunto agora é Carnaval? Bela lembrança...! Pena que eu não guarde nenhuma em especial dos carnavais passados, nenhuma tão delicada quanto a tua, dessa época da infância. Abro e fecho as gavetas da memória, reviro-as e nada encontro de relevante. Estudava em colégio de freiras e o Carnaval para nós era um tempo de recolhimento e oração. Entediava-me e ficava torcendo em agonia para que logo chegasse “a quarta-feira ingrata”, a quarta-feira de cinzas, quando tudo então chegava ao fim. Na quarta-feira tudo se aquietava tudo se acalmava, até a natureza, tudo se recolhia em descanso, num silêncio respeitoso. Respeito a quê? A morte da “alegria”, que era preciso acabar para que tudo voltasse ao normal. Recordo-me ainda desses dias de festas, e das vezes em que víamos alguma coisa, como os blocos de sujo, passando em plena algazarra por dentro das ruas do bairro, jogando para todos os lados confetes e serpentinas. Achava linda a chuva de confetes e as serpentinas atiradas a esmo, eram como que laços que prendiam o expectador ao folião, unidos na mesma alegria nem tão barata assim. Lança-perfumes, já por esse tempo; usava-se muito pouco devido a proibição, mas os confetes coloridos que enfeitavam as ruas e calçadas, uma vez lançados eram re-reunidos em pequenos montes e lançados com euforia pela criançada, sucedendo o mesmo às serpentinas que ficavam dependuradas em fios ou galhos de árvores, balançando ao sopro do vento, como que pedindo para serem puxadas de onde estavam enroladas novamente e atiradas a uma longa distância até por fim acabar sua curta existência. Aos bailes infantis também nunca fui e fantasias só aquelas que eu vestia em minha imaginação. Ai, Clarice em meu tempo de menina fui sedenta como tu e nessa sede insensata absorvia a energia estranha e poética que saia da vida dos outros, pois, para mim só havia a alegria dos outros (uma alegria, aliás, que eu pouco entendia) e as máscaras não me metiam medo... o que eram máscaras de brinquedo diante das máscaras que realmente recobrem nossos rostos? Aprendi muito cedo a distingui-las. Aprendi muito cedo que as pessoas e seus mistérios, encantam e desencantam, as pessoas e seus mistérios fizeram dar-me conta do meu próprio mistério que de tão escondido era insuspeito em mim. Por muitos anos Clarice, não tive em casa ninguém doente, como tiveste tu em teus dias de infância, mas mesmo assim não pulávamos Carnaval (quero dizer nós, as meninas) entretanto, meus irmãos, os dois maiores, rapazolas, corriam soltos participando de tudo quanto era jeito. Liberdade não lhes faltava nunca; fosse Carnaval ou não, mas eu não lhes tinha inveja. Tinha meu próprio mundo. Usei uma vez um vestido de papel crepom e se não me falha a memória, não foi para um baile de carnaval, mas sim para uma festa junina. Não me lembro direito do modelo, só me lembro que era vermelho. O papel me deixou toda manchada, porém nada que um bom banho não resolvesse. Tu, Clarice, te preocupavas com a tua fantasia de papel que podia desfazer-se caso uma chuva viesse a cair e eu só me preocupava com o vestido, justamente, por ser ele de papel e que podia rasgar por qualquer motivo e a qualquer momento. Eu não pensava na vergonha que sentiria se tal coisa acontecesse, eu me preocupava era com a fragilidade e a feiúra do vestido. Bem, querida, em teu recordar tinhas apenas oito anos, eu, no meu repensar, era um pouco mais velha e talvez por isso mais vaidosa; sentindo em mim, aflorarem os primeiros anseios de menina-moça, e sem saber o que fazer, não me reconhecia, era como que outra pessoa abrindo caminho à força por dentro de meu ser. Para mim Clarice, os Carnavais, até hoje, são “melancólicos”, quem sabe, seja assim por me lembrarem coisas que não vivi, e talvez tivesse gostado de viver e sobre as manhãs de Carnaval; na azáfama dos preparativos, tenho pra te dizer que um dia de travessura infantil e puro devaneio, um dia de manhã bem cedo, sai desfilando minha fantasia, minha fantasia de “louca varrida”, de sonhadora incorrigível, mas, ainda era muito cedo e todos dormiam, nem o sol havia despertado. Desfilei avenida abaixo, sem carro alegórico ou comissão de frente e para os quatro cantos, gritei minha poesia. Ninguém me jogou confetes. Ninguém me aplaudiu. Ainda era muito cedo e todos dormiam. Ninguém me ouviu. Em plena avenida, despi-me da fantasia, ficando completamente nua. Não era mais uma “louca varrida”, nem uma sonhadora incorrigível, era somente eu mesma menina-flor-mulher, em flagrante desabrochar, cândida, fresca e frágil... Ninguém me viu. Ainda era muito cedo e todos dormiam, nem o sol havia despertado. Mas posso te dizer Clarice, que a minha poesia ficou gravada na memória daquela manhã de carnaval. Das coisas que já me aconteceram, houve sempre o melhor e o pior, mas eu não acredito que o destino seja um jogo de dados irracional, não acredito nem sequer que nossa vida seja um jogo de qualquer espécie, porém, impiedosa, muitas vezes ela é, e certos fatos que nos sucedem são mesmo difíceis de superar ou sequer compreender e sinto que algo morreu em mim antes mesmo d’eu começar a viver, eu já nasci desencantada. Não quero com essa frase parecer trágica, mas é assim que me sinto. Quando alguma alegria tenta se instalar, lembro-me de todas as coisas ruins que me aconteceram e o que acontece aos outros cotidianamente e isso lança sombras escuras sobre o meu contentamento. E a alegria dos outros sempre me apavora, embora seja esta alegria compreensível e desejável, tanto para eles quanto para mim. Deve ser algum boicote, alguma sabotagem que faço a mim mesma, uma, um muro invisível que ergui para me impedir de ver ou sentir a luz do sol. Eu sou Clarice, uma rosa que ama o sol, mas que ao mesmo tempo teme o seu brilho. Ergo-me sobre este muro, esta barreira invisível e desafio a infelicidade que de forma irônica zomba de mim. Mesmo assim tento manter-me firme acima do muro, até um dia ter coragem de ir mais além. O sol amigo me diz que este muro inexistente deve sumir para sempre, pois não há felicidade sem tristeza ou vice versa. Ninguém é sempre alegre ou sempre triste, deve ser um meio-termo, algo assim entre os dois. Eu sou Clarice, hoje, uma rosa-mulher solitária ao pé de um muro invisível que há muito deixou de ser menina e que quando perdida em seus receios, se sente uma palhaça pensativa de lábios vermelhos, querendo então que algo surpreendente aconteça e de que tudo não seja apenas um sonho ou uma delirante fantasia, algo surpreendente, que traga consigo a centelha iluminada da verdade e que de repente me devolva a menina que fui um dia, menina com cheiro de rosa, com perfume e encanto de mulher.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-MANHÃ DE CARNAVAL


MANHÃ DE CARNAVAL

De manhã bem cedo, sai desfilando minha fantasia, ainda era muito cedo e todos dormiam, nem o sol havia despertado.
Desfilei avenida abaixo, sem carro alegórico ou comissão de frente e; para os quatro cantos, gritei minha poesia.
Ninguém me jogou confetes. Ninguém me aplaudiu. Ainda era muito cedo e todos dormiam. Ninguém me ouviu.
Em plena avenida, despi-me da fantasia, ficando completamente nu. Ninguém me viu.
Ainda era muito cedo e todos dormiam, nem o sol havia despertado. Mas, a minha poesia ficou gravada na memória daquela manhã de carnaval.


Do livro MORONETÁ; Crônicas Manauaras; Virgínia Allan, AEditora Valer

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

DEUS É MAIS FORTE


O pequeno Ibotity subiu num árvore, mas quando menos esperava pôs-se o vento a soprar. Fazia “vuuuuuuu, vuuuuuu...” com tanta força, pra cá, para li, pra acolá, que a árvore vergou e se partiu. Ibotity caiu e quebrou uma perna...
“Ai, ai.. que árvore forte”... disse Ibotity ...“é tão forte que quebrou minha perna”.
“Que nada, menino”... disse a árvore... mais forte do que eu é o vento, que sopra sem cessar. Deixa estar”.
Porém, o vento ouviu o que a árvore disse e, rapidamente, respondeu que mais forte do que ele era a colina que o podia parar. Então, Ibotity acreditou que a força estava na colina, uma vez que podia deter o vento que derrubara a árvore que tinha quebrado sua perna.
“Não, nada disso...” disse a colina e pôs-se a explicar como o rato era mais forte, uma vez que podia esburacá-la.
“Ah, mas eu posso ser pego e morto pelo gato”, protestou o rato. Ibotity imaginou que a força estava no gato...
“O quê? Um exagero”... disse o gato que reclamou que podia ser apanhado por uma corda.
“A corda...” pensou Ibotity... “deve ser a coisa mais forte que existe”. Mas, a corda foi logo se queixando que podia ser partida pelo ferro... portanto, o ferro era muito mais forte. O ferro ouviu e negou tal afirmação, pois ele podia ser derretido pelo fogo. Ibotity chegou a conclusão de que o fogo era poderoso, o mais forte de todos, já que derretia o ferro, que partia a corda, que prendia o gato, que caçava o rato, que esburacava a colina, que parava o vento, que fazia tremer a árvore que quebrara a sua perna. Mas o fogo contestou dizendo que a água era mais forte. A água, por sua vez disse que era a canoa que por ela deslizava mansamente. A canoa negou e disse que mais forte era a rocha, que disse, enfim, que mais forte ainda era o homem, entretanto este afirmou que, na verdade, mais forte do que ele, era o mago que passava sem nenhum dano pela prova do veneno, que era um teste de Deus. Assim, Ibotity se convenceu que Deus era mais forte que tudo, já que ele punha a prova o mago, que dominava o homem que quebrava a rocha, que derrotava a canoa, que sulcava a água, que apagava o fogo, que derretia o ferro, que partia a corda, que prendia o gato, que matava o rato, que esburacava a colina, que parava o vento, que partira a árvore que havia quebrado a sua perna...



O CAVALO MAGICO e outros contos do Oriente para crianças do Ocidente; Edições Dervish

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

ROCK, A MÚSICA QUE TOCA


Infelizmente, não estou podendo atualizar os assuntos sobre o blues. Meu notebook pifou e todas as notas estavam lá... estou meio perdido... uma mente em branco, embora não queira isto dizer que esteja totalmente sem memória... Estou lendo ROCK, A MÚSICA QUE TOCA, do escritor sempre super-antenado Simão Pessoa. Uma leitura muito aconselhável a todos os amantes de uma boa música, assim como de uma boa história. Neste livro, Simão, em cuidadosa pesquisa, reconta a história do rock, com todas as suas divisões, começando com a Country Music/Hillbilly, Blues/R&B, Rockabilly/Rock 'n' Roll e assim por diante, chegando aos dias atuais com New Age/Guitar Dance, Britpop/Crossover... com todos os seus heróis e seus altos e baixos. Longa trajetória feita de tristezas, suor, lágrimas, mas alegrias também. Quem ainda não leu, deveria ler... Aliás, o livro faz parte de uma trilogia, sendo: Rock, a música que toca; Reggae, a música que pulsa, e Funk, a música que bate, estes dois últimos com edições esgotadas e sem previsão de reedição... é isso, “quem tem, tem, quem não tem se contêm”... é o que estou tentando fazer, me conter e não ficar me lamentando por ter perdido algo que me seria agora de grande ajuda. Lançado no verão de 2004, Rock, a música que toca passou por um episódio tragicômico que se não fosse pela persistência/paciência/resignação de Simão, teria ficado, para sempre, onde fora parar, isto é, na cesta de lixo, pelo desproposito de uma secretária do lar que Simão apelidou carinhosamente de “terremoto californiano”. Sim, lá se foram os originais, mais arquivos e recortes acumulados durante anos. Nessa época pensou até em defender a pena de morte para crimes hediondos. Mas, ainda bem que ele recomeçou e nos brindou com um excelente apanhado de uma preciosa história, comum a todos... senti falta apenas das presenças femininas, que, parece-me, Simão deixou um tanto de lado... talvez não de forma proposital, talvez apenas lhe tenha passado desapercebido... principalmente no Blues... Bom, nao será a primeira vez que ele ouve uma queixa sobre algo que deixou de comentar... já lhe aconteceu, na época do lançamento da primeira edição Passei anos só na vontade de comprá-lo, porém, nunca estava muito bem de grana a ponto de fazer a despesa. Há poucos dias, “sem quê nem pra quê” isto é só um modo de dizer, pois, na verdade, tudo tem um propósito) Rock, a música que toca, veio ter em minhas mãos, e eu, como bom cristão que sou, agradeci aos céus por este grande favor, embora, às vezes, lá no fundo, desconfie, que, tudo tenha sido mesmo obra e graça do demônio...

domingo, 15 de fevereiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-EGOTRIP



EGOTRIP

Sem toques ou retoques... amanheci cinzento, com gosto amargo na boca... não estou disposto... um gato cruza o meu caminho... ainda bem que ele não é preto; ainda bem que eu não sou supersticioso... quem sabe as horas? Mergulho em uma “egotrip” e me desconecto de tudo... procuro refúgio do mundo por dentro de mim... por dentro de mim eu não me sôo ridículo nem absurdo... por dentro de mim sou eu mesmo, aonde mexo e remexo, me viro do avesso... faço uma canção... caio em contradição... descomplico o complicado... desfaço o errado, o malfeito... por dentro de mim mesmo sou perfeito ou puro exagero... às vezes amo demais... às vezes amo de menos... às vezes amo a quem não deveria amar... às vezes amo a quem deveria... aí estou no lugar certo, com a pessoa certa, na hora certa... mas isso é tão raro, vocês sabem... é mais fácil um raio cair duas vezes no mesmo lugar... deixa como está... pra quê mudar?... Olha quem vem lá... vem tão devagar... nem dá para notar que está de azul... há sempre um blues a esperar... que é que há? Um suspiro de alivio... uma noitada no inferno devorou meu coração... de antemão o demônio me avisou... eu, como sempre o ignorei, pois é bom ceder a tentação, pouco importa o tamanho do pecado... mais tarde o preço cobrado nos prega um susto danado... aí, pra nos desculpar culpamos a fatalidade e o pobre do diabo, coitado... quantas cores mesmo tem o arco-íris? Qual a distância da terra ao céu? Quem ama quem me ama? Um objeto não identificado corta o espaço e minha canção pra ela nem está pronta... outro suspiro... entediado... me recomponho... pego aqui e ali, meu eu desconjuntado... aos pedaços... chove a cântaros... chove chuva sem parar...

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

CHUCK, CHUK...


E lá estava o rapaz, na mesma esquina, encostado à parede, a fazer ignotas rimas. Cantava ele uma canção antiga, e de sua guitarra arrancava as notas azuis e melancólicas de um blues...

CHUCK, CHUCK...

Chuck queria ser famoso
Chuck queria ganhar o mundo

Pegou a guitarra no quarto
E pela fresta estreita da porta
Deu uma espiada lá fora...

Nossa, que desassossego
Nossa, que confusão, mas, aí, meu irmão
Chuck aproveitou a ocasião
Tirou um riff de sua guitarra
E o mundo endoidou desde então

Chuck tocou e cantou um blues invocado
E deu asas ao diabo
Num instante, Chuck, voou
Virou o pai do rock ‘n’ roll

E tocando a guitarra adoidado
Chuck comprou um carro
Comprou uma mansão
E com os trocados que sobraram
Comprou um avião

Chuck ficou famoso
Era dono do mundo

Tinha muitas garotas
Uma diferente pra cada dia
Virava a noite perdia o dia
E fazia o que queria

Mas fama garotas e grana
Não consolaram sua solidão
E as noites silenciosas
Doíam-lhe no coração

Chuck era famoso
Era dono do mundo

Mas agora que tinha tudo
Só a guitarra lhe bastava
O mundo lá fora o esperava
Chuck, porém, nem ligava

Chuck sorriu
Chuck chorou
Chuck bebeu
Chuck fumou
Chuck bateu
Chuck apanhou

Chuck pensou que fosse fácil
Mas perdeu a hora
Pensou que fosse tarde
Ainda dava tempo de ir embora?

Chuck pegou a guitarra no quarto
E largou sua mansão
Chuck vendeu o carro
E tomou o avião
Voou de volta para casa
Despido de ilusão

Chuck era famoso
Era dono do mundo

Mas tudo o que queria agora
Era chegar em casa
E espiar a vida lá fora
Pela fresta estreita da porta

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-MAIS QUE UM DIA NUBLADO...


MAIS QUE UM DIA NUBLADO...



Há mais que chuva e frio em um tempo nublado... De vez em quando um raiozinho de sol escapa pelo furo de uma nuvem cinzenta e carrancuda... um presente para alguém hoje distraído como eu... Ando mais depressa... e, como sempre, na pressa, nem reparo na singeleza dos detalhes que todo dia me escapam, faça chuva ou faça sol... Alguns dizem que "Deus está nos detalhes"... Talvez seja verdade... Bom, cá estou eu a me repetir...“Oh, Lord! Save me”... Há perigo em cada esquina; você nunca sabe se hoje será ou não o seu último dia, pois esse pensamento nem ousamos pensar, já que, medo há só de soletrar a palavra morte, que dirá pensar nela todo dia, e, sem pensar, você passa, incauto, diante do perigo ou então vai direto de encontro a ele... “Há perigo na oportunidade?” ou “Há oportunidade no perigo?” Depende da situação; para alguns, ambas as frases significam a mesma coisa e para outros “nem todo igual é semelhante”... para mim, quase tudo que me é desconhecido é perigoso e nem sempre vejo nisso oportunidades escondidas... talvez não saiba avaliar bem as situações, guio-me muito pela intuição, portanto, se um olhar ou um timbre de voz me provocarem arrepios, ou, melhor dizendo, para que nada fique subentendido, “calafrios”, trato de “arrepiar carreira”... talvez haja mesmo uma oportunidade... para o outro do olhar sombrio e voz melíflua e suas obscuras intenções... Às vezes, há mesmo mais que chuva e frio em um tempo nublado... às vezes há um calor abafado e uma espécie de torpor... há impaciências revestidas de incertezas... há mesmo um certo temor de que o sol nunca mais apareça... Claro... sei que há o lado bom e feliz de um dia nublado, não precisam me lembrar e que, para mim, pode ser traduzido, ou musicado, como um cantinho de solidão e paixão, no longínquo e profundo vale pensamento, um cantinho reservado no oco do mundo de mim mesmo, onde não há vez para angústias que nunca se vão; um cantinho particular onde a música possui sabor e cor, um cantinho limpo, puro, onde a alma se alimenta, enquanto o coração descansa...

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-DESPEDIDA


DESPEDIDA

Havia flores espalhadas pelo chão
O portão, velho e enferrujado, pendia de lado

Evidente era o abandono
Evidente era a solidão

Desconfiado, o vizinho olhava-me, de soslaio
Mesmo assim, inclinou a cabeça, em singela saudação

Continuei minha inspeção...

Dentro da casa tudo estava como antes
Faltava apenas o calor humano a recepcionar o visitante
Ninguém...

Havia uma saudade impregnada nas paredes
De onde agora pendiam somente quadros
Flores ressequidas nos pequenos vasos e uma velha cortina
a balouçar ao vento

Embora triste, precisava vir me despedir
O passado ainda era ferida aberta, doída, no coração
Mas evidente era o abandono
Evidente era a solidão

Assustou-me a aparente calma
E o negro buraco percebido a tempo
Vozes, do nada, me assaltaram
Sai abruptamente...

Apressada, pisei as flores
Quase pus abaixo o portão...
Mandei um aceno mecânico para o vizinho que me olhara de soslaio
Fui embora pra não mais voltar...


Parei de chorar...
O tempo passa e com ele nossos desenganos

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

CONVITE


No crepúsculo da tarde que cai
conversemos, meu querido, frente a frente
em silêncio, de alma para alma; de coração para coração

Carrego comigo minhas grandes tristezas
e também as pequenas alegrias
Dividi-las-ei contigo, meu único e caríssimo amigo

Suaves hoje são meus pensamentos
Distantes estão agora todas as agonias

Sentemo-nos aqui, debaixo do céu que é nosso teto
e olhemos juntos, a lua que nos sorri
Ouve... ela murmura-nos um segredo e nos convida
a dançar

É o começo de tudo
Nossos pés se movem num ritmo lento
Tu me sorris e olhamo-nos, outra vez, em silêncio, frente a frente
olho no olho... Reconhecemo-nos enfim...

Somos ambos, meu querido, filhos da mesma estrela
Somos ambos, meu amigo, filhos do sol

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-INVERNOS ENTRE VERÕES


INVERNOS ENTRE VERÕES


Tenho vivido tantos invernos
mesmo em meio aos verões que já nem estranho...
Uma saudade de um raio de sol me invade

Um pai leva com cuidado a filha ao colo
Sorriso suave estampado no rosto onde o sol se derrama
em mornas caricias... Fios de cabelos de anjo solto ao vento
de uma cálida, límpida manhã

Fui feliz assim, um dia, nessa constância de uma vida in - comum

Sopram agora outros ventos
Sussurram agora em meus ouvidos outras doces, monótonas cantigas
E antigas vertigens retornam aos meus dias

Invisíveis tormentos me acalentam os sentimentos
Fogo brando que nunca se apaga...

Revolvo minha alma nessa estranha saudade
de tempo idos, que não mais voltam
Dói-me o peito
Brota a mágoa
Invernos de solidão em meio a verões de silêncios





segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

PETICIÓN DE UN FALCON



Abd Al-Aziz Ben Al-Qabturnuh (fallecido después de 1126)
Traducion: Emilio Garcia Gomez



¡Oh rey, cuyos padres fueron altaneros y del más egregio rango! Tú, que adornaste mi cuello con el collar de tus favores, grandes como perlas y engarzados como las perlas en el hilo, adorna ahora mi mano con un halcón.

Hónrame con uno de límpidas alas, cuyo plumaje se haya combado por el viento del Norte. ¡Con qué orgullo saldré con él al alba, jugando mi mano con el viento, para apresar lo libre con lo encadenado!


PEDIDO POR UM FALCAO


Abd Al-Aziz Ben Al-Qabturnuh (fallecido después de 1126)
Tradução: Virgínia Allan


Oh rei, cujos magníficos pais pertenceram a mais antiga linhagem! Tu, que enfeitaste meu colo com o colar de teus favores, grandes como pérolas encadeadas em um colar enfeita agora minha mão com um falcão .
Honra-me com uma de suas límpidas asas, em que a plumagem tenha sido vergada pelo vento Norte. Com que orgulho com ele sairei ao alvorecer. Minha mão ao vento, a balouçar pára, juntos, a liberdade fazer de presa


http://www.webislam.com/?idc=1976

sábado, 24 de janeiro de 2009

SEM...



Sem chão... Sem pão... Sem inspiração...
Sobram-me versos encruados, desencantados, medíocres pontos soltos perdidos no branco espaço
Palavras sem sentido, distorcidas, que revoam pra lá e pra cá que nem pássaro engaiolado, de triste cantiga
Espero na ante-sala, sentado em um sofá, uma porta ser-me aberta... Longa espera entremeada de silêncios e decepções
Faço por onde concretizar meus planos, porém, desagradam-me os meus pensamentos... E não vejo saída às contradições da vida
Preocupa-me a longa espera... Levanto-me do sofá e vou à porta, devagar, mas ela continua fechada
Retorno ao ponto de partida e desabo meu corpo cansado no sofá mal arrumado e deixo meu espírito inquieto vagar descontente, solitário, sobre a superfície nua, lisa e fria de um céu-mar verde azulado, vazio de estrelas

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

15 MINUTOS




A carapuça que nos cabe...

“Não sou nada
Eu nunca serei nada
Aparte isso tenho em mim
todos os sonhos do mundo” (F. P)

E eles estão à venda... quem dá mais?

Vende-se ou troca-se sonhos
Por uma parcela ínfima de encanto
Um afago no ego e no reconhecimento, um brinde em taça de cristal
ao engano e ao talento

Vende-se ou troca-se sonhos
Por um momento de glória e descanso
Na fútil cama da fama, entre lençóis de cetim e colchas de seda
Um instante de descanso sem pensar em grana, por um tempo de fartura
Por um bafejo de esperança

Vende-se ou troca-se sonhos
Por moedinhas de cobre dourado
Um mísero cachê contado ou mesmo ainda uma bolsinha de couro remendado

Venha apreciar, por favor, o meu trabalho
Veja como faço bem a minha arte
Mereço ou não uma consideração?
Por favor, um pouco de atenção...

Continuarei “artista” apesar de tudo...
Adverso ou não aos prós e contras
Tenho direito aos meus 15 minutos
Estou à venda e não discuto
Aceito a esmola atirada no chapéu da mendicância









terça-feira, 20 de janeiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-APENAS UM DETALHE


APENAS UM DETALHE

Ainda dando asas ao meu melancólico estado de desencanto (me aguentem mais um pouco...) darei um exemplo de como somos tolos, ao deixar-nos levar pelo desânimo. Faço isto mais como um exercício... quem sabe me ajudando, me confessando, acabe, por fim a ajudar alguém? Espero que pro bem... Um tempo atrás, um pequeno acidente tomou para mim a proporção de um desastre gigantesco... uma coisinha de nada, de repente, virou um dragão, um bicho de sete –cabeças. Nós, “humanos”, temos essa mania besta de transformar tudo em algo medonhamente gigantesco, dramático e o pior, sem saída... Bom, não sei o que aconteceu, só sei que meu leitor de CD do meu notebook não funciona mais, apesar de, aparentemente, o programa não apresentar nenhum problema e o PC ser novo, nem um ano de uso... Não seria nada demais se as músicas que tinha gravado no computador, um vasto e variado repertório, simplesmente também não houvessem desaparecido sem deixar vestígios. Lá se foram os meus blues na voz do velho Big Bill Broonzy e alguns outros bluesmen de responsa... Na verdade, ter perdido as músicas foi somente um detalhe, um detalhe muiiiiiiiiiito chato, mas é claro que não estou chateada só por causa disso... Recomeçar, seja com o que for ou de que jeito for, é a nossa missão de todo dia, mas levando-se em conta tempo, satisfação e amor pelo que já estava em andamento, recomeçar é uma chateação, além de requerer coragem, esforço, determinação e paciência qualidades, que até tenho, e falo isso sem falsa modéstia, mas, não estou animada para nada, estou numa fase de plena insatisfação e olha que estou falando de um “probleminha”... Caso a se pensar... se estou agindo assim agora, o que será que farei diante dos “grandes problemas” ou direi, dilemas que a vida sempre nos apresenta? Não sei... ou melhor, eu sei, tenho umas regras as quais recorro quando me encontro nesse estado de espírito, regras preciosas que, aliás, já deveria ter assimilado e usado quase que por instinto. Em minha displicência, é fato notório de que talvez esteja de “mal a pior” comigo mesma. Isso me faz lembrar de um episódio de COLD CASE, uma de minhas séries prediletas, em que um psicopata colecionador assassino pegava suas vitimas, sempre mulheres, e as trancava em um quarto escuro.Todas estas mulheres, suas vitimas, tinham um motivo especial para viver, motivos estes que, em sua mente doente, justificava o seu crime: Uma tinha um lindo bebê, a outra uma voz maravilhosa com a qual louvava ao Senhor e a outra, um amor de verdade, daqueles que são pra vida toda, na alegria e na tristeza. O prazer do colecionador psicopata, e assim era o seu método de matar, era justamente tirar dessas mulheres a vontade de viver, tirar delas a fé, a esperança, até o ponto que nem o motivo que, antes, as mantinha presa a vida tivesse mais a menor importância. Em relação a elas, levá-las a desistência era o seu maior e principal objetivo. Sua primeira vítima morreu afogada em um poço, quando ele, adolescente ainda, ao passear pela floresta, ouviu pedidos de socorro e foi então que, recusando-se em ajudar, deparou-se com a cena que ele julgou a mais insólita, a mais linda, a mais sublime que já havia visto: Alguém, por total falta de esperança, por decepção, desistindo de viver. Ele ficou lá, à beira do poço, apenas ouvindo e observando, e em vez de ajudar, cuspiu na água, olhando fixamente nos olhos da moça, esboçando no rosto juvenil um sorriso sutil e feliz. Suas duas outras vítimas tiveram a mesma reação. A mãe se esqueceu do seu filho; a moça devota se esqueceu de seu Deus e, mesmo com todas as saídas, de forma proposital, facilitadas (não seria impedida se quisesse fugir) ainda assim; ela aquiesceu, e, deixou-se morrer, mas, a moça que encontrou seu amor verdadeiro todo dia recomeçava, na escuridão da cela úmida e infecta, ao som do badalo de um sino que todo dia, às mesmas horas, tocava o refrão de uma canção. Para não morrer de tristeza naquele lugar, a moça se agarrou a poesia desses instantes breves e mágicos, repletos de luz; ao soar do sino ela sabia exatamente o dia e a hora em que estava e acompanhava o badalo com sua voz fraquinha, baixinha, quase um murmúrio... Ela não se perdeu, nem esqueceu o seu amor... encheu de luz a escuridão e todo dia recordava a si mesma, todo dia recomeçava nem que fosse na solidão agonizante de uma espera longa e mortal. Hummmmm! Depois de ler o que escrevi, eu deveria me “tocar”... não? Recomece minha senhora, recomece já de onde e do jeito em que está... é tempo ainda... E, cá entre nós, tens muitos motivos, não citarei cada um, para continuares viva. Enche de luz a escuridão e recomeças a contar a tua própria história; nem que sejas tu mesma, a única ouvinte.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-DESENCANTO


DESENCANTO

Desencanto... hoje sou, estou puro desencanto... desencantado com tudo... com o meu futuro, o futuro do mundo... A causa disso deve ser o tempo... chuvoso e sempre apressado... não encontro um jeito de fazê-lo ficar ao meu lado... corro com ele, contra ele, mas nunca ao seu lado... Mas isso são coisas de gente que desencantou; quem desencanta desperta para outra realidade, talvez, desencantado, abra os olhos para a verdadeira realidade da vida. Não temos chance com aqueles que estão surdos, mudos, cegos... “Em terra de cego quem tem olho é rei? É, certamente, mas com poucas chances de exercer o seu poder de modo eficiente... Conheço alguns reis que nunca tem suas ordens acatadas, pois os cegos além de cegos, são surdos, ou melhor, ouvem o que querem e quando querem, sendo também poucas vezes mudos, falam quando deveriam calar... Acho que esta minha apreciação faça jus a mim... deveria estar agora de boca fechada, vedado os pensamentos, predisposto a inação... deveria eu simplesmente estar quieto no meu canto, curtindo a minha solidão, o mau tempo e o meu mau-humor... mas, infelizmente para uns e felizmente para mim, enxergo, ouço e falo bem demais e me recuso a deixar passar tudo em brancas nuvens...

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

SEGREDOS QUE PERMEIAM A NOSSA IGNORÂNCIA




Clarice Lispector


Há muitos segredos, Clarice, que permeiam a minha, a nossa, ignorância, que, por vezes, a sinto de forma por demais brutal. Ignorância cheira sempre a omissão, tens razão, é obvia a sensação de mal-estar, de ignorância... enfim, é mesmo uma horrível sensação. E, se cresce, como a escuridão, até se tornar palpável, como dizes, chega a ser uma ofensa descomunal, sem tamanho... a ignorância que nos é imposta (e aceita por nós) é propositalmente sustentada por aqueles que deveriam nos abrir os olhos e a mente, realmente é uma ofensa impar, imperdoável a qualquer um de nós enquanto seres pensantes. Ainda estamos como na Idade Média, pois o que me ofende mesmo é o descaso com que somos tratados cotidianamente. Somos patos, bobocas, prato cheio para políticos mau-intencionados que nos roubam no maior cinismo e disfarçam tudo com discursos floreados, distorcidos, de suas pretensas boa vontade inexistentes. E nós sem entendermos nada, porque sempre somos "vítimas" e até parecemos gostar dessa posição... pobre de nós, pobre povo... sempre vítima das situações. O que nunca entendemos, é que nós, como povo, temos poder, mas sempre intimidados, deixamos de usá-lo. O povo é roubado, espoliado sempre em sua própria época, seja lá em que espaço de tempo for. Coitado do povo. Porém, entenderia o povo se soubesse que é tão poderoso? O que falta ao povo... discernimento? Será que essa ignorância precisa ser permanente... precisa perdurar para sempre... por que não termos um povo sábio, ciente e condutor de seu próprio destino? Será que isto nunca será possível? Será que os segredos físicos e psíquicos, o sumo bem, estão velados ao povo?... bom... há um ditado que diz “que toda maioria é burra”... Será? Nos tratam como crianças tolas, incultas, nada modestas com a alegria, embevecidas, comovidas, com a piedade e os “cuidados” de quem nos humilha, e o fio de esperança realizáveis, quase invisível, que por Deus nos é estendido, não por piedade, mas, por nos ser de direito, este fio de esperança, dádiva divina, matéria do qual são feitos os sonhos, passa por nós “quase” desapercebido... “quase” nunca é visto.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

MAIS QUE FÁBULA, VIDA REAL...


Tradução Virgínia Allan
Era uma vez, não faz muito tempo, certo edifício infestado por ratos. Os administradores deste decidiram por bem exterminá-los, então, certa noite espalharam raticida de cima abaixo da construção, porém, na manhã seguinte o veneno tinha desaparecido, os ratos o haviam comido. “Trocaremos o veneno”, disseram os administradores e fizeram nova tentativa. Mas, também esta segunda dose mortal, foi gulosamente ingerida pelos ratos, que, ainda deram mostras de que muito haviam aproveitado a nova dieta.
Decidiram-se recorrer às velhas ratoeiras e para tentar aos ratos imunes a veneno, utilizaram como isca, suculentos pedaços de queijo. Entretanto, os ratos nem tocaram o queijo. Foi aí, que, um dos administradores, pensou: “Talvez os ratos tenham desenvolvido gosto pelo veneno, talvez lhes faça bem”. Assim supondo, comunicou aos outros e armaram um plano, que foi posto em execução na mesma noite: colocaram nas ratoeiras, queijo polvilhado com veneno. Na manhã seguinte, as ratoeiras estavam cheias de ratos fortes e saudáveis.

Desta história, pode-se extrair toda sorte de moral e ensinamentos, mas, a citamos aqui, por ser absolutamente verídica ou pensa você que as fábulas são meros produtos da imaginação, tolas fantasias, destinadas somente a divertir ou instruir? As melhores fábulas se extraem da vida real, da própria comunidade e dos processos mentais do individuo.

De uma notícia impressa no Daily Mail, Londres, 2 de Dezembro de 1967, pág. 9, col. 3... coletada por Idries Shah e posta como nota introdutória de seu livro REFLEXIONES, Edições PAIDOS.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

AFORISMOS


Tradução: Virgínia Allan


Otimismo/Pessimismo: Às vezes, um pessimista é tão somente um otimista com informação adicional.


Os fins e os meios: Estarão à deriva aqueles que crêem, todavia, que um meio possa ser um fim.


Oportunidade: As pessoas se esquecem que, quando se aceita uma oportunidade, esta não seja, talvez, o que crêem que seja. Um homem reconhece e aceita uma oportunidade de acordo com o grau de homem que é, e também se esta oportunidade é uma que realmente lhe corresponde.


Fama e esforço: O esforço torna famosos a alguns gandes homens. Um esforço ainda maior, permite que a outros grandes homens permaneçam desconhecidos.


Prejuízo: As gentes não podem manobrar o prejuízo porque tentam entender-se com o sintoma. O prejuízo é o sintoma, as suposições erradas são a causa. "O prejuízo é o filho da suposição.


Talento: O talento é a presença da habilidade e a ausência da compreensão sobre a fonte e funcionamento do conhecimento.


Conhecimento x Crença: O conhecimento é algo que tu podes utilizar. A crença é algo que utiliza a ti.


Sombra: Hás notado que quanta gente que caminha na sombra, maldiz o sol?


Idries Shah; REFLEXIONES, Ediciones Paidos


sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

NOTA DISSONANTE



No céu do Oriente, há tempos não brilha a luz da estrela de Belém. Ela foi empanada por outra espécie de brilho, certamente menos belo, menos amável, menos intenso... porém, certeiro, rápido e mortal. Hoje, o que brilha no céu do Oriente, não são os foguetes de festas, nem de felicidades, e a fumaça que sobe não é um sinal de paz... O brilho, no céu do Oriente, é traiçoeiro, medonho e voraz. Ultimamente, as crianças palestinas tem sofrido bastante... elas estão levando a pior... pais assustados, desesperados... famílias inteiras, há anos, raramente escapam dos bombardeios lançados ou do brilho de ódio que percebem nos olhos do estranho que mora ao lado; ódio acumulado, tanto de um lado quanto de outro, por décadas e décadas de uma guerra interminável. Acontece agora tal e qual aconteceu outrora, em tempos remotos, quando Jesus e sua família fugiam da ira assassina dos soldados romanos; a história se repete do mesmo modo, brutal e cruel, mas neste cenário atual, nos dois lados, não há reis magos, nem José e Maria, há apenas meninos Jesus assassinados, homens e mulheres, seres humanos massacrados, desamparados, que recebem de presente do mundo calado porções de mísseis, fuzis, bombas, mártires suicidas e granadas de indiferença; indiferença que campeia triunfante por entre os homens errantes desta terra, que exercem em seus domínios, em puro delírio, egoístico poder... infelizmente, parece não haver solução... irredutiveis sãos os dogmas, as ideologias apregoadas, o ensinamento religioso deturpado... A Jihad islâmica, certamente continuará, Israel resitirá e será assim, até a destruição total... até o fim dos dias... Tomara que não... Estamos todos a espera de um milagre e não do Juízo Final...

Cantilena do Corvo

EE-SE BLUE HAVEN

Ee-se encontrou Ahemed na saída de Hus. Dirigia-se ela aos campos de refugiados, nos arredores de Palmira, enquanto Ahemed seguia com seu pa...