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domingo, 27 de julho de 2008


Cruzes pelo caminho quantas mais cruzes pelo caminho cruzes ó Deus pai choro lamento ranger de dentes cruzes vista que se assoma e se perde vai dói nos olhos o ver dói na alma o saber dói no coração não poder perdão não há para os amaldiçoados que vagam na terra a fazer seu trabalho nem o diabo duvida que são bons na lida quem afinal dele precisa? Ninguém nem o João da esquina João precisa de um consolo que as preces não lhe dão mais para ele Deus ou o diabo tanto faz as ruas do país estão pavimentadas com sangue desespero suor lágrimas dor homem mulher criança nada ninguém escapa a policia atira antes pergunta depois aí já foi mais cruzes pelo caminho quantas mais cruzes pelo caminho ó Deus pai

terça-feira, 15 de julho de 2008

REFLEXÕES DE UMA ALIENIGENA SOBRE O ESTRANHO COMPORTAMENTO DOS SERES HUMANOS PARTE VI - OS ILHÉUS, UMA FÁBULA-FOLHETIM N.o 01



Como hoje o dia está ameno, e, eu, “mais ou menos”, contarei uma história ao estilo de folhetim, isto é, dividida em várias partes, posto que é um “conto muito longo e que nunca termina”....esta frase tomei de empréstimo de uma outra que contarei depois... em diferente ocasião... Os humanos adoram coisas assim...É natural...é parte de seu histórico de vida...a criação dos mitos e fábulas, pertencem ao imaginário de qualquer povo, em qualquer lugar do Universo. Meu povo sempre se serviu mais das histórias e menos de exercícios intelectuais, para, através delas, tornar possível a preservação de algumas verdades afim de serem retransmitidas e trabalhadas ao longo do tempo nos diversos estágios de evolução. E, embora existam as “fábulas comuns, de entretenimento”, largamente consumidas e mescladas a um material mais raro, são tidas estas pelos estudiosos da consciência, como uma forma de “arte degenerada e inferior”. Eu sou um contador de histórias, esta é uma de minhas funções, se não me engano já lhes disse isso, embora já tenha pensado em pedir uma despensa desta função, o que, em verdade, seria de minha parte uma extrema ousadia...não posso escolher só o que me convêm...para que um ensinamento faça o seu efeito sobre um aprendiz é preciso que o mesmo aceite as funções que lhes são impostas... Bom...vamos a história...Os Ilhéus, segundo Idries Shah, é uma fábula sufi que fala justamente sobre a condição humana. A fábula, seguindo o conselho dos antigos, foi devidamente adaptada e atualizada, coisa que deve acontecer a toda história, levando-se sempre em conta três fatores: “o tempo, o lugar e as pessoas”.




OS ILHÉUS [1]
UMA FÁBULA




“O homem comum se arrepende de seus pecados;
o eleito se arrepende da insensatez deles.”
(Dh’l-Nun Misri)


Era uma vez, não muito distante daqui, um país composto por uma sociedade ideal, que vivia na mais plena e perfeita harmonia. As pessoas que a compunham não sentiam o medo que conhecemos e sentimos hoje em dia. Em vez de incerteza e vacilação, havia decisão, determinação e meios mais completos e produtivos de se expressar. E, assim, sem empecilho, sem nenhum tipo de tensão ou pressão que a humanidade tem em conta e até considera fundamental, essencial ao seu progresso, a vida dessa gente era muito mais rica, porquanto outra espécie de aspiração ou necessidade, mais nobre, mais elevada, cobria aquelas outras... Vivia assim, portanto, essa gente,um modo de existência levemente diferente. Pode-se mesmo dizer que as nossas percepções atuais são apenas variações cruas, temporárias, das percepções reais, verdadeiras, da qual era dotada. Suas vidas eram realmente VIDAS, não vidas semi-vividas. Este era o povo de El-Ar.

Um dia, o líder de El-Ar descobriu que o país se tornaria inabitável por um longo período, pelo menos por uns vinte mil anos. Era preciso agir e planejou-lhes a fuga, mesmo sabendo que seus descendentes só poderiam retornar para casa após inúmeras tentativas.

Depois de tanto procurar, encontrou para o seu povo um bom lugar, uma ilha, levemente parecida, em todas as suas características, com o seu país natal. Por causa do clima, um tanto diferente, e, pela recente situação, os recém-chegados sofreram uma transformação que os tornou física e mentalmente capazes a se adaptarem às novas circunstâncias. As percepções refinadas tiveram que ser modificadas, substituídas por outras mais grosseiras, tome-se como analogia as mãos de um trabalhador manual que se tornam mais calosas em resposta ao trabalho que exerce. A fim de amenizar a dor que o permitiria comparar os dois estados, o antigo e o novo, o povo foi levado a se esquecer quase que totalmente do passado, restando somente uma vaga lembrança, mas o suficiente para ser despertada quando chegasse a hora.

Ao todo, o sistema era bastante complicado mas muito bem arrumado. Os órgãos por meio dos quais o povo sobreviveu neste lugar foram transformados em órgãos de prazeres físicos e mentais. Quanto aos órgãos que no país natal funcionavam plenamente, foram postos em um tipo de inatividade temporária, ligados aquela vaga lembrança de algo que, de vez em quando, insistia em surgir.

Devagar e com esforço, os imigrantes foram se instalando, adaptando-se às condições oferecidas pelo ambiente. Os recursos da ilha eram de tal forma que, aliados ao esforço e a um tipo especial de orientação, possibilitariam ao povo uma nova fuga para uma outra ilha, na viagem que empreenderiam de regresso ao país de origem. Esta foi a primeira de uma série de ilhas em que se contatou gradual adaptação.

A continua “evolução” desse povo, recaiu sobre os ombros daqueles mais capacitados de arcarem com ela; alguns poucos indivíduos, já que, por forças das condições, o povo em geral não conseguia reter os dois tipos de conhecimento em suas consciências sem entrarem em conflito, o esforço era grande demais, revelando-se mesmo, enfim, virtualmente impossível, então, para maior segurança, certos especialistas guardavam a “ciência especial”. O “segredo”, ou seja, o meio ou método para fazer a transição, não passava mais do que o conhecimento de habilidades marítimas e sua forma de aplicá-las. Assim, para se fugir dali era preciso que houvesse um instrutor, um material básico, gente, esforço e compreensão. Havendo essas coisas, o povo poderia aprender a nadar e construir navios.

Os primeiros encarregados das operações de fuga deixaram claro para todos que antes de aprender a nadar ou mesmo até ajudar a construir um navio era necessário um certo preparo. Durante um tempo tudo transcorreu normalmente. Entretanto, um homem, tido, na ocasião, como carente das qualidades necessárias se rebelou contra essa ordem e desenvolveu uma ideia genial. Ele notara que o esforço para fugir impusera um fardo bastante pesado e até mesmo aborrecido sobre o povo, mas, que, todavia, mostrava-se, ao mesmo tempo, propenso a creditar no que lhe contavam sobre os modos e os meios levados a efeito para se fugir dali. O homem percebeu que poderia tirar vantagens disso, obter poder e ainda vingar-se daqueles que o haviam humilhado, assim pensou apenas explorando as duas situações de fato. Simplesmente se ofereceria para tirar-lhes o fardo das costas afirmando que não havia, em verdade, fardo algum e então, declarou o seguinte: “Não é necessário que o homem tenha que primeiro integrar a mente e treiná-la da forma que lhes disseram, pois a mente humana já é algo estável, contínua e consistente. Foi lhes dito que precisavam se transformar em artífices, para poder construírem um navio... pois lhes digo eu que não precisam ser artífices, não precisam de navio...A um ilhéu, como você, como eu, bastam somente a observação de regras bastante simples para sobreviver e permanecer unido à sociedade. Através do exercício do bom-senso, inerente a todos, podemos alcançar qualquer coisa de fato nesta ilha, nosso lar, que a nós pertence como propriedade e herança”.

O rebelde tagarela despertou grande interesse com esse discurso em meio ao povo. E provou a veracidade de sua mensagem, dizendo: “Se há mesmo alguma verdade em construir navios e em nadar, deveriam nos mostrar navios e nadadores que foram e voltaram”. Pronto! Um desafio fora lançado aos instrutores que não o puderam enfrentar, já que o desafio baseava-se numa suposição sofistica que jamais, o povo idiotizado, captaria. Mas, fato é que, na realidade, nunca havia voltado nenhum navio da outra terra. E os nadadores que regressavam eram submetidos a uma readaptação que os tornavam invisíveis à multidão. Por conta disso, o povo insistiu junto aos instrutores para que estes lhes fornecessem uma prova que lhes demonstrasse que tinham razão. Então, numa tentativa de argumentação contra os rebelados, assim disseram os encarregados das construções navais: “A construção de navios, é, antes, uma arte e um oficio, que, para empreendê-la a contento, exige o aprendizado e o exercício de técnicas especiais, e, que juntas, formam uma atividade integral que não pode ser estudada por partes como vocês estão a sugerir. Esta atividade contêm um elemento impalpável, a baraka, do qual advêm a palavra ‘barco’ – navio. Baraka significa ‘a sutileza’ que não há como lhes ser mostrada”.

Ao ouvirem isso, os revoltosos puseram-se a gritar: “Tolices e mais tolices...sandices...arte, oficio, totalidade, baraka... bah...querem apenas nos enganar”. Desse modo, pegaram todos os artífices que puderam encontrar empenhados na construção de navios e os enforcaram. Um novo evangelho libertador foi proclamado e recebido com bastante entusiasmo pelo povo. O homem, enfim, chegara à conclusão de que estava maduro! A impressão que tinha, ao menos por ora, era a de que fora isento de qualquer responsabilidade.

A maior parte dos outros modos de pensar foi imediatamente absorvida pela sua simplicidade, conforto e conceito revolucionário e passou a ser considerado um principio básico, nunca, jamais contestado por um ser racional, entendendo-se por “racional” qualquer um que, como pessoa, se ajustasse perfeitamente a nova teoria em que se fundamentava agora a dita sociedade. As idéias opostas ao novo estatuto foram descartadas, posto que, rotuladas como fora de propósito, “irracionais”, ruins. Daí em diante; mesmo na dúvida o individuo deveria suprimi-las ou afastá-las porque precisava se adequar a qualquer custo e dessa maneira ser reconhecido como racional. De mais a mais, era fácil ser um racional, para isso bastava ao sujeito aderir aos valores da sociedade vigente, além do quê, o que mais havia eram abundantes provas da veracidade da racionalidade, dado fosse que não se pusessem a pensar na vida além das cercanias da ilha.

A sociedade, agora, temporariamente em equilíbrio, parecia proporcionar, pelo menos no que dizia respeito a partir de seu próprio ponto de vista, no seu entender, uma integração coerente, posto que, uma vez fundamentada na razão somada a emoção, fazia parecer realmente que ambas eram totalmente verossímeis. Desejam um exemplo? O canibalismo era aceitável, pois estava muito bem respaldado por argumentos racionais, já que se descobrira que a carne humana era boa para consumo. A comestibilidade é uma característica do alimento, portanto, o corpo humano era alimento e sendo assim, comestível. Percebendo, porém, a deficiência desse raciocínio e com a intenção de compensá-lo, os novos pensadores fizeram uso de um artifício: se controlaria o canibalismo no interesse da sociedade. O meio-termo seria a marca registrada do equilíbrio temporário, mas, de quando em vez, alguém punha em destaque um novo meio-termo e a luta entre a razão, a ambição e a sociedade gerava alguma nova regra social.

Como as habilidades necessárias para se construir navios não possuíam dentro da sociedade uma aplicação lógica, óbvia, o esforço requerido e empregado foi considerado fora de contexto, absurdo, sendo, diligentemente, posto de lado uma vez que os barcos eram descartáveis, já que não havia mesmo aonde ir. A pseudocerteza, substituta da verdadeira certeza, faz parte de nosso cotidiano, como o fato de supor que o amanhã chegará e que até lá ainda estaremos vivos. Ao fazermos certas suposições somos levados a “provar” tais suposições, todavia os nativos da ilha aplicavam a pseudocerteza em todos os aspectos da vida.

A grande Enciclopédia Universal da Ilha, escrita e organizada por estudiosos, nobres e respeitados filósofos, continha dois verbetes que nos mostram como funcionava o processo. Os sábios, munidos de sincera boa vontade, espalhando o saber da única nutrição mental que estava ao alcance, haviam instituído um certo tipo de verdade:

NAVIO: Desagradável. Imaginário método de transporte, em que falsos sábios e ilusionistas do povo, garantiram poder “cruzar a água”, assertiva que hoje em dia se comprovou cientificamente absurda, impossível. Não existe na ilha nenhum material conhecido que seja impermeável à água e com o qual se possa construir “navios” em tais condições, sem tocarmos na questão de se saber ou não se há um destino além da ilha. É um crime capital apregoar sobre a construções de navios punido através da Lei XVII do Código Penal, subseção J, “A proteção dos crédulos”. Definida como forma extrema de escapismo mental, A MANIA DA CONSTRUÇAO DE NAVIOS, é sintomático, claramente encarado como um problema de desajuste. É obrigatório pelo sistema constitucional que todos os cidadãos, que, portanto, revestidos dos deveres que lhe são impostos, notifiquem as autoridades sanitárias competentes se ao menos vierem a suspeitar de que existe esta trágica condição em qualquer individuo. 

Veja: Natação; Aberrações mentais; Crime (Capital).

Leituras: Por que os “navios” não podem ser construídos, de Smith, J., Monografia da Universidade da Ilha, numero 1151.

NATAÇÃO: Repugnante. Método supostamente usado para impulsionar o corpo na água para evitar afogamento, normalmente visando objetivo de “alcançar um lugar fora da ilha”. O “aprendiz” dessa arte repreensível, extremamente repugnante, tinha que submeter-se a um grotesco ritual de iniciação: primeiramente, devia deitar-se no chão, mover os braços e as pernas em resposta às instruções do “professor”. O conceito, por inteiro, tem como base o anseio dos pretendidos “professores” de dominar e manter os crédulos em tempo de barbárie. Em período recente, o culto tornou-se um tipo de mania epidêmica.

Veja: Navio; Heresias; Pseudoartes.

Leituras: A grande loucura natatória, de Brown, W., 7 vols., Instituto da Lucidez Social.

As palavras “desagradável” e “repugnante” eram constantemente usadas na ilha para assinalar qualquer coisa que conflitasse com o “Agradar”, o novo evangelho proclamado, assim denominado. 

A intenção real, não dita, mas implícita “por debaixo dos panos”, era que, no geral, as pessoas que compunham a comunidade se agradassem somente do que o Estado poderia se agradar. Agradando ao Estado estariam agradando a si mesmos, Estado e povo, unidos num só coração. O Estado era o povo, o povo era o Estado.

Sendo desse modo, não era de se espantar que, desde as mais remotas, primitivas eras, a maior parte das pessoas se enchesse de pavor só de pensar em abandonar a ilha, como sói acontecer com prisioneiros que, após muito tempo, aprisionados, a ver o sol nascer quadrado, se vêem na iminência de serem libertados. Mundo vago, sombrio, desconhecido, ameaçador era qualquer outro lugar “fora” do cativeiro. Não era uma prisão a ilha, era antes uma jaula com barras invisíveis, porém, muito mais eficientes que aquelas que se podiam ver.

A sociedade insular foi se volvendo dia a dia mais complexa e só poderemos, dentre as suas principais características, examinar umas poucas. Vejamos a literatura...muito rica, que, além das composições culturais, havia um número inimaginável de edições que explicavam os valores e realizações da nação. E havia ainda um sistema de ficção alegórica que mostrava o quão terrível poderia ter sido a vida, se a sociedade insular não tivesse se adaptado ao atual e tranquilizador estilo de vida.

Os antigos instrutores, de tempos em tempos, tentavam fazer por onde ajudar os membros da comunidade a escapar. Em favor do restabelecimento de um clima em que os construtores de navios pudessem prosseguir em seu trabalho, os Capitães, imbuídos desse propósito, acabavam por se sacrificarem, conforme requeria a necessidade.

Como era comum na ilha, dava-se facilmente para quase tudo, explicações relativamente plausíveis, portanto, todos estes esforços eram interpretados por historiadores e sociólogos, segundo as suas percepções, com referências às condições da ilha. Os estudiosos não faziam qualquer idéia, nem imaginavam, um possível contato exterior dessa sociedade extremamente fechada em si mesma. Os princípios de ética não estavam envolvidos, uma vez que os doutores continuavam a estudar com veraz sinceridade aquilo que, de fato, lhes parecia ser verdade. “Que mais, além disso, podemos fazer?” perguntavam a si, pondo ênfase na palavra mais, tentando dar a entender assim, que, a alternativa poderia ser um esforço de quantidade. Sem repostas adequadas, perguntavam-se uns aos outros: “Que outra coisa podemos fazer?” Supondo-se que, outra coisa, pudesse conter uma resposta. Há de se concluir depois disto, que aos ilhéus, oferecia-se um campo inteiro, enorme, para se pensar, agir e exercer seu domínio dentro de seu pequeno e envolvente mundo. A impressão que se tinha era que, as variações de idéias e diferenças de opiniões, ofereciam plena liberdade no pensar que, então, era bastante estimulado, desde que não beirasse o “absurdo”. Também se permitia liberdade de palavras, que, porém, eram de pouquíssima utilização sem o desenvolvimento da compreensão, que não era levada a cabo. Levando em conta esses fatores, os navegadores, tiveram que incluir em seu trabalho, outros aspectos, relevantemente de acordo com as mudanças constatadas no seio da comunidade, o que deixava a realidade, para os estudantes, mais ainda desconcertante, já que eles buscavam acompanhar aos navegadores a partir do ponto de vista da ilha.

Nesta situação caótica, confusa, até mesmo a capacidade de se lembrar da possibilidade de escapar da ilha, algumas vezes, acabava por se transformar em um obstáculo. A emoção consciente da possível fuga não era muito discriminatória e, na maioria das vezes, os ansiosos aspirantes a fujões acabavam se decidindo por um modo substituto de escape. Não era nada útil ter apenas um vago conceito de navegação sem a devida orientação, até dentre os mais promissores construtores de navios, com grande potencial, mesmo estes, os mais ardorosos, dedicados à causa plenamente, eram levados pelo condicionamento a acreditar que já traziam consigo essa orientação, e que há muito estavam prontos, e se alguém ousasse lhes dizer que precisavam de preparação, este alguém virava logo motivo de ódio.

Versões da construção de navios e da natação espalhadas pela ilha, algumas estranhíssimas, com freqüência, excluíam, pela força do número de ansiosos, as possibilidades reais de evolução. Atitudes censuráveis, repreensíveis, tinham os advogados da pseudonatação ou dos navios alegóricos, mercenários, cujos interesses escusos faziam-nos se aproveitarem da situação dos mais fracos, descuidados, que ainda não possuíam a capacidade totalmente desenvolvida para nadar, oferecendo-lhes lições ou passagens em navios que sabiam, não poderiam construir.

A principio, as necessidades da sociedade insular, tinham exigido a criação de certas maneiras eficientes no pensar, resultando isso no que então, chamaram por ciência. Essa maneira admirável de opinar sobre um assunto, do seu jeito de ver, e tão fundamental nos campos em que era aplicado, terminou por ultrapassar, indo muito além do seu verdadeiro significado. O ponto de vista “cientifico”, imediatamente após a revolução “Agradar” ampliara-se tanto, mas tanto, que cobriu toda espécie de idéias e assim, tudo, todas as coisas, que o ponto de vista “cientifico” não abarcasse, passaram a ser denominadas como “não-cientificas”; providencial, conveniente sinônimo de “ruim”. 

Mesmo as palavras eram aprisionadas, agrupadas e automaticamente escravizadas.

Sem a presença de uma atitude harmônica, adequada, os ilhéus, feito àquelas pessoas que, entregues a si mesmas na sala de espera de um consultório, contando somente com seus próprios meios, põem-se a folhear, exaltadas, as revistas disponíveis; assim também eles se concentraram na busca de substitutos do propósito original e final do exílio da comunidade: a realização. Muitos deles conseguiram distrair a atenção de tal maneira, através de atitudes, principalmente, de cunho emocional que acabaram por serem, mais ou menos, bem sucedidos, e embora houvessem diferentes níveis de emoção, não havia como medi-las, não havia uma escala de medição que convinhesse, e, portanto, sem poder medi-las, não havia distinção entre um ou outro tipo; toda e qualquer espécie de emoção, enfim, era considerada “funda” ou “profunda”, tanto fazia, contanto superior e mais “profundo” que a não-emoção. A emoção, valorizada, instantaneamente qualificada de “profunda” que se podia conceber, costumava levar as pessoas a cometer atos extremos, tanto físicos quanto mentais.

A maioria dos ilhéus tinha por hábito, escolher para si, ou permitir que outros escolhessem, metas viáveis, objetivos alcançáveis e, daí, podiam então dedicar-se a um culto após o outro, ou ainda ao dinheiro e à projeção do status social.

Alguns ilhéus, por adorarem certas coisas, se achavam superiores ao resto ; outros, por repudiarem o que supunham ser um culto, sem ídolos e poder, tiravam desse "desapego" o “direito” de escarnecer, zombar, com segurança de tudo o mais.



Os séculos passavam, e, à medida que iam passando, viu-se a ilha atulhada de destroços, objetos desses cultos. O pior de tudo é que esses destroços eram autoperpetuantes, nunca lixo comum. Alguns ilhéus & ilhéus associados, bem intencionados, combinaram e recombinaram estes cultos, que voltaram então a se propagar, constituindo-se esse material, acadêmico ou “inicial”, uma verdadeira mina para o amador e para o intelectual, já que provocava uma sensação de variedade e conforto. 

Multiplicaram-se pela ilha magníficas instalações para o gozo, ou deleite da “satisfação” limitada. De repente, por todos os cantos , apareceram palácios, monumentos, museus, universidades, institutos de saber, estádios esportivos, teatros...a ilha ficou abarrotada...e o povo, naturalmente, sentia deveras orgulho desses recursos, pois, muitos deles eram considerados por muita gente, embora não de forma totalmente clara, como ligados, de maneira geral, a verdade fundamental.

Como parte integrante de algumas destas atividades, em diferentes dimensões, estava a construção de navios, mas, de um jeito desconhecido de quase todos. Em segredo, os navios desfraldavam suas velas, os nadadores continuavam a ensinar natação...as condições da ilha não foram motivos suficientes para desanimar aquela gente dedicada; afinal, ela também viera da mesma comunidade, seu local de origem, não estava dissociada dela nem de seu destino. Tinham entre si laços indissolúveis, entretanto, precisava, frequentemente, se proteger das atenções da população que, fatalmente, poderia atrair, posto que, em outros tempos, fora por demais perseguida. Alguns ilhéus “normais”, por exemplo, tentaram salvá-la de si mesma; outros tentaram matá-la, exterminá-la da superfície da ilha por razões que julgavam igualmente santas, heroicas, sublimes, necessárias... e outros ainda, mesmo desejando desesperadamente por sua ajuda, nunca conseguiram encontrá-la. Tais reações, todas elas, a saber, com respeito à existência dos nadadores, eram resultados da mesma causa, isto é, partiam da mesma fonte, mas, filtradas por diferentes tipos de mentes...todavia, quase todas, porém, em seu entender, sabiam agora em que consistia um nadador, onde se encontrava e o quê estava ele a fazer...

Conforme avançava o progresso, e a vida na ilha ia se tornando cada vez mais civilizada, apareceu uma estranha indústria, mas, claro, impregnada de lógica, dedicada a semear duvidas sobre a legalidade do sistema em que se baseava a sociedade. Esta indústria conseguiu reter as ânsias, as agonias, as perguntas sem respostas, enfim, as dúvidas, alimentadas pelo povo a respeito dos valores sociais, e expô-los a troça, ao ridículo, à sátira...A tarefa poderia apresentar ora um rosto triste, ora um alegre, mas, no âmago, na essência, tornou-se apenas mais um ritual mecânico... a indústria, de potencial valioso, era, comumente, impedida de exercer suas funções realmente úteis, criativas. Pensavam as pessoas, que, ao darem luz às suas dúvidas, ao dar-lhes uma forma de expressão, ainda que temporária, conseguiriam, de certo modo, senão exterminá-las de todo, pelo menos atenuá-las, exorcizando-as até um ponto, que, finalmente parecessem aplacadas. A sátira passou a ser uma alegoria aceitável, significativa, considerada, embora completamente indigesta. Peças, livros filmes, jornais, poemas pasquins e folhetins eram os meios, os veículos utilizados para o seu desenvolvimento, mesmo que uma grande parte desses veículos, atuassem dentro dos campos intelectuais, mais acadêmicos. Para muitos habitantes da ilha, seguir esse culto em lugar dos outros mais antigos, era ou assim lhes parecia, muito mais moderno, progressivo, emancipado...seguir esse culto era estar na vanguarda dos tempos.

Lá e acolá, aqui e ali, vez por outra apresentava-se um candidato a um instrutor de natação, a fazer sua barganha, e, geralmente, o que ocorria, em verdade, era um estereotipo de conversação:
“Quero aprender a nadar”.
“Queres fazer uma troca? Uma barganha?
“Não. Só quero levar minha tonelada de couve”.
“Que couve?”
“A comida de que vou precisar, quando chegar a outra ilha”
“Mas, lá existe comida muito melhor”.
“Não sei...Como posso ter certeza? Preciso levar minha couve”.
“Não vês, em primeiro lugar, que não podes nadar carregando uma tonelada de couve?”
“Então não poderei ir a lugar nenhum. Sem minha couve, não...O que tu chamas de carga, eu a chamo de minha nutrição essencial, imprescindível”.
“Em vez de couve, imaginando uma alegoria, diga-se “suposições” ou “idéias destrutivas”.
“Levarei minha couve a algum instrutor que realmente compreenda as minhas necessidades”.

*****

Ai, ai...esses humanos e suas necessidades imprescindíveis são mesmo um tormento...ou se chora ou se ri...bom...pararemos por aqui...a fábula fabulosa sobre construtores de navios, nadadores e daqueles que tentaram acompanhá-los, com maior ou menor escala de sucesso, ainda não terminou porque ainda há gente na ilha.

A linguagem cifrada é um meio utilizado pelos sufis para transmitirem suas mensagens. Este conto foi escrito no idioma inglês e somente algum tempo depois, traduzido para o português e outros idiomas...sem olvidarmos este detalhe, relevante, retomemos o fio do pensamento, real...please...: Alguém se lembra o nome da comunidade citado no inicio da história? Pois é...El Ar...mudando-se as posições das letras teremos a palavra “Real”, que é o seu nome original; já o nome adotado pelos revolucionários, “Agradar”, em inglês, “please”, com as letras rearranjadas, teremos “asleep”, que significa adormecido. Dizem que quem conta um conto aumenta um ponto...por favor...nem sempre é necessário enfeitar o que não pode nem deve ser enfeitado...algumas histórias, embora pareçam imperfeitas, são perfeitas em seu propósito, construção e conteúdo...esta é uma delas. 

Fiquem em paz. Salam! 

Saiu por uma porta entrou por uma outra...quem quiser que conte outra


[1] Os Sufis, Os Ilhéus - Uma Fábula, Idries Shah, trad. Octávio Mendes Cajado, 1977, Ed. Cultix

segunda-feira, 14 de julho de 2008

O COMEÇO DO MUNDO - LENDA MUNDURUKU



Houve um tempo em que apenas os espíritos dos deuses pairavam sobre a vasta quietude do Universo.
Houve um tempo em que o homem era somente uma idéia, um pensamento inquieto que de vez em quando teimava em lhes vir à mente.
Tupã, o furioso senhor do trovão, do alto de seu trono, olhou, certa vez, para aquelas bolas que enfeitavam o céu. Achou-as feias e murchas. Então, para suavizar um pouco a aura de tristeza que as envolvia, resolveu dar luz àquela idéia persistente.
Para isso escolheu a bola azul e nela colocou dois homens, Curu e Rairu, pai e filho, dando-lhes o poder de criar tudo o que fosse necessário à vida.
Curu e Rairu estavam felizes, radiantes mesmo com a abençoada missão, mas Tupã ainda não havia terminado.
“Faço-lhes, contudo”, disse ele, “uma restrição. Estão terminantemente proibidos de criarem gente, ouviram-me? Esqueçam-nas, para que desse modo consigam viver bem e em paz”.
Dito isto, Tupã afastou-se, deixando os dois homens terrivelmente frustrados.
Embora tristes, os dois foram fiéis às ordens do deus. Curu, sendo o mais velho e mais sábio, resignou-se logo, submetendo-se à suprema vontade. Rairu, entretanto, ainda sonhava em ver o novo mundo povoado.
'Para que um mundo tão grande e tão belo se não podemos compartilhá-lo?’ Perguntava-se.
Seu pai não tinha e nem procurava respostas. Já não comungava daquele entusiasmo quase obsessivo do filho. Costumava dizer-lhe que se Tupã quisesse ver esta terra povoada, cheia de gente, teria ele mesmo feito isto. Se não o fez é porque algum motivo havia. Há somente uma forma de entender e é descobrindo porque se quer entender. Quem sabe, se começássemos a receber gente e mais gente, começariam as mudanças. Poderiam vir outros tipos, diferentes, uns assim, com a pele mais clara e por isso mesmo, se julgando melhores que os outros. Seria o começo de nossa desgraça.
Rairu nada queria ouvir. Cansara-se da solidão. Para fugir da mesmice de sua vida, dormia não se importando se fosse noite ou dia.
Um dia, teve um sonho e em seguida tomou uma resolução: apanhou uma pluma branca; dependurada numa amendoeira, e fez com ela uma comprida corda de algodão que amarrou no tronco da árvore, metendo a outra extremidade num buraco de tatu.
Passado um tempo, homens e mulheres começaram a subir pela corda; feios, bonitos, puseram-se a subir.
Os mais inteligentes e pacíficos disseram pertencer à nobre raça dos Mundurukus. Proclamavam-se guerreiros invencíveis, desdenhando os ataques à traição e protegendo os filhos orfãos da parte derrotada. Trouxeram consigo macabros troféus, as pariná (cabeças dos inimigos mumificadas e, reduzidas em tamanho) e uma arte plumária de qualidade primorosa. Esta gente deixou Rairu perplexo. Assim continuou subindo gente; subia gente de tudo quanto era jeito pelo buraco do tatu.
Mas, de repente, ai, horror dos horrores! Para seu desespero Rairu viu um sujeito cara pálida tentando subir; um sujeito incomodamente estranho.
Rapidamente o jovem abaúna, lembrando-se dos conselhos de seu velho pai, cortou a corda, tampando o buraco com as mais pesadas pedras que pôde encontrar.
O tempo tornou a passar, ou melhor, a voar. As nações indígenas cresceram e se multiplicaram, espalhando-se por todo o grande e verde vale.
Os sábios e valentes Mundurukus foram para o baixo Caiari
1, até onde o rio deságua no Paranauaçu 2. Sua cultura floresceu, se expandiu, tornou-se Mundurukânia, a de ricas tradições, orgulho da raça tupi.
Certa manhã, Rairu, já esquecido do buraco do tatu, chamou seu pai para juntos irem caçar. Passaram perto do buraco e uma tristeza negra apossou-se de seus corações.
O branco conseguira afastar as pedras, saíra pelo buraco e sumira-se na floresta. A infelicidade e o desassossego haviam chegado.
O velho Curu preparou-se para algo ruim desde o dia em que soubera da desobediência do filho, porém, não pode evitar as lágrimas que teimosamente escorreram de seus olhos e numa voz terna e cansada, disse-lhe: “Desafiaste a ordem estabelecida por Tupã. Tua insatisfação levou-nos à ruína. Jovem tonto! Quisestes baixar as nuvens somente para fazer sair a chuva. Por tua escolha o mal está solto pelo vale, festejando o início de seu reinado. É chegado o fim da nobre e feliz, Mundurukânia, é chegado o fim para todo o povo da raça tupi”.
*****
1 Caiari: Madeira2 Paranauaçu: Amazonas
*****
BRASIL; Altino Berthier, Amazônia Legendária, Poesanato, Arte e Cultura, Porto Alegre, 1999.

domingo, 13 de julho de 2008

REFLEXÕES DE UMA ALIENIGENA SOBRE O ESTRANHO COMPORTAMENTO DOS SERES HUMANOS PARTE V


Já faz alguns dias que a inspiração não dá-me o ar de sua graça... o papel só não está totalmente em branco porque estou tentando passar para ele este sentimento de vazio interior completo. Nada me vem à mente, nenhum um pensamento patético, poético, nem um pensamento mágico lúdico “brilhante” para brindar a mim ou a quem me lê e por isso não quero escrever qualquer coisa... palavras mal ditas acabam por revelarem-se “malditas” no lato sentido da palavra... que estou a dizer.. Ah... isso então eu sei, são meus pensamentos blue devils, de puro desânimo... pulam da mente para o teclado, mal me deixam trabalhar... não estou triste; não estou alegre, só desanimado... Há uma escada da terra ao céu, difícil, mas não impossível, é topar com o primeiro degrau... Todavia, não vou reclamar do mundo nem de seus habitantes; os cegos, surdos e mudos... já me conformei de ter que viver entre vocês; também não vou reclamar do tempo, nem do calor agonizante... Procuro na Internet por boas noticias, procuro por inspiração... entro nos sites, mas nada encontro... aonde foram parar? Não é possível... deve haver, meu Deus, gente feliz de verdade nesse mundo, deve haver um lugar seguro sem tanta futilidade, frustração ou indiferença... deve haver amor, respeito, amizade no lado perfeito da maçã... embora, aparentemente, as circunstâncias nos levam a crer que a humanidade inteira viva na banda podre... Humm... inconscientemente (agora, nem tanto) devo estar em busca do paraíso perdido, porém o “mar não está pra peixe”... Melhor tirar um descanso... Deixo por um tempo a mesa do computador e ligo a TV, entretanto, a vida me surge no vídeo da mesma forma, em aspectos irrelevantes, medíocres, violentos e absurdos e a vida deveria ser maior do que tudo, é com o que sempre contamos, que a vida em si, seja maior do que tudo... maior até que o meu desânimo... Ponho um disco no aparelho de cd... ouço um pouco de cada gênero, rock, blues, jazz, ópera, clássico, rap, funk e até um forrózinho pé de serra na voz do velho Gonzagão, o rei do baião, nada me apetece o espirito... penso então em meus possíveis amores (os aliens também amam) penso em meus amigos mais queridos, porém nada disso me ajuda... a comunicação com pseudos amantes e caros amigos é meio confusa e embaraçosa e além do quê “longe dos olhos, longe do coração” (esse dito não funciona para mim, pois acredito que quando se ama profundamente essa comunicação é constante, ininterrupta... ) Deixemos desses pensamentos... um café cairá muito bem... vamos à cozinha, relaxar um instante, beber uma xícara da bebida negra doce/amarga estimulante... como um blues... bem... para me fazer de importante e arranjar uma desculpa para o meu iminente fracasso como cronista, contista, poeta, contador de histórias, escritor sem leitores, posso ao menos dizer como dizem muitos humanos, que estou “atravessando meu inferno astral”... mais outro?! Sabe, isso soa como piada... inferno astral...?! Tem lá cabimento culpar os astros? Logo eu que atravessei os sete céus, viajando por galáxias distantes, passando por sóis, estrelas, luas e luas, ansiando pelo mar da tranqüilidade absoluta? Eu, que almejei me transformar na própria lua ou no próprio sol?!... Hoje me dói estar só, confesso... mas, “antes só do que mal acompanhado”, eis aí um ditado muito certo, nesse concordo com os humanos... já vi muita gente fazer bobagens por conta de se sentir solitário, por conta de não saber ser só e devemos aprender a ser e estar sós nesse mundo. 

Tentei fazer uns
Versos/Reversos/Diversos/Inversos/Controversos
Infinitas/Cantigas/Longínquas/Rimas...

Pronto! Morreu aí... não me vieram mais palavras para o continuar... essa crônica também, acho que morre aqui... Não darei mais ao meu desânimo importância maior que a necessária, não farei isso comigo, nem com vocês, nem com o medo e muito menos com a solidão, sentimentos inseparáveis do desânimo, primo-irmão do desespero, senhor da loucura, pai de todos os enganos ... senão eles crescem (e como crescem) e ficam tão poderosos que acabam por nos exigirem soluções radicais, mortais, irreparáveis.
Enquanto escrevia este texto, assistia as novelas... sim, gosto de novelas... e de algumas outras coisas que considero e reconheço como bobagens, (não que todas as novelas o sejam)... só porque sou um ser evoluído não posso gostar de coisas assim? Apesar de meu aspecto grave, sério, acreditem ou não, sei sorrir e apreciar os pequenos e doces enfeites e encantos que tornam a vida mais agradável e que nos ajudam a prosseguir... mas, voltando ao assunto, acabei de mudar de canal e por coincidência ou ironia, está passando Razão e Sensibilidade, uma produção anglo-americana baseada no romance de mesmo nome, da escritora inglesa Jane Austen. Já o assisti, porém irei vê-lo mais uma vez... é o tipo de filme que me dá aconchego, me desperta esperança e me devolve as boas lembranças. Um pouco mais de Razão e Sensibilidade é o que precisamos, nós, todos os seres. Uns, certamente, muito mais do que outros.

sábado, 12 de julho de 2008

INSPIRAÇÃO

Sob o sol da manhã, o papagaio grita na casa da vizinha, a cigarra canta, o cachorro late, a criança chora.... A rua tranqüila do bairro tranqüilo se inquieta com essa cantoria sem sentido que lhe perturbam os ouvidos, a mente e o coração... o poeta não consegue pensar e parado em frente à tela do computador, ficará, emburrado, o resto do dia. A felicidade hoje não lhe será possível...

sexta-feira, 11 de julho de 2008

CONTRÁRIOS/SEMELHANTES



Seguem adiante, de mãos dadas na mesma estrada, em equilibrada quantidade espalhada pela humanidade. A mesma porção de paciência / impaciência; saúde / doença; sabedoria / ignorância; felicidade / infelicidade / tristeza / alegria / melancolia... dor; desgraça / harmonia... lembrar / esquecer; eu / você; tormento / alento / desalento / calma / silêncio... cara / coroa; "as duas faces da mesma moeda" ou "as duas faces do mesmo espelho"; “as duas metades da laranja”; sorte / azar; crença / descrença; presença / ausência; sucesso / fracasso; branco / negro; doce / amargo; doce / azedo; direita / esquerda; longe / perto; céu / inferno; feio / belo; guerra / paz; fogo / água; yin / yang; dia / noite; luz / escuridão / solidão; perigo / salvação; sanidade / insanidade; sol / lua; sol / chuva; amor / ódio; tragédia / comédia; como as máscaras (as minhas, as suas, as nossas) que simbolizam o teatro e enfeitam o meu anel... riso / pranto; cedo/ tarde; verdade / mentira; ilusão / desilusão; Deus / diabo; vida / morte / ressurreição...
sim / não...

quinta-feira, 10 de julho de 2008

FOLHAS DE OUTONO



Na fria cama de mármore, jaz o gentil cavaleiro.
O escudo e a espada partida repousam em seu peito.
Após a última batalha, o jovem senhor já não sonha.

O cavaleiro desolado parou à borda do precipício. Lançar-se nele seria a sua salvação, talvez a única possível. Fora, finalmente, subjugado pela terrível força negra contra a qual lutara durante muito tempo.
Seu cavalo estava morto; sua espada quebrada e sua alma despedaçada. Doía saber que não mais poderia voltar atrás. Teria de deixar, para sempre, os verdes campos de sua terra natal; abandonar sua casa; a amada esposa e duas lindas filhas e partir em direção à desesperança. Embora inesquecíveis foram-se os dias felizes ao som da sinfonia do vento espalhando as delicadas folhas de outono quando ainda podia acreditar que saíra vencedor de uma cruel batalha. Mas, a força negra se manifestou com toda a sua força e novamente tomou conta de seu ser. Então, a mente adoeceu; o corpo enfraqueceu e ele percebeu que havia perdido a guerra.
A armadura lhe pesava mortalmente. Com o coração partido, a morte lhe beijava a face enquanto lhe sussurrava doces palavras. Sim, seria bom não poder pensar em mais nada e aceitar de bom-grado o desejado final.
A escuridão cresceu a sua volta e ele não conseguia mais ver ou sequer raciocinar, sentia apenas o torpor do aroma embriagador que subia das profundezas do abismo. Era tarde; muito tarde. Não havia mais a canção do vento por sobre as folhas de outono; nem o cálido pôr de sol; nem o lamento da chuva; não havia mais a lembrança do colo quente e dos beijos carinhosos de sua mulher; não havia mais a candura de rostos infantis, nem o aconchego da casa. Era tarde; muito tarde e não havia mais a sinfonia do vento por sobre as folhas de outono e o abismo não podia mais esperar.
Assim, o jovem cavaleiro; derrotado em sua última aventura, lançou-se como um pássaro do alto do precipício e de repente, por um breve instante, sentiu-se imensamente feliz; enfim, livre, para todo o sempre.








quarta-feira, 9 de julho de 2008

TULIPA NEGRA



Graciosa rainha da noite, que a lua enche de graças e
infindáveis carinhos.
Nenhuma canção, jamais, fará jus a tua beleza, pois
nenhum bardo, por mais sábio que seja, conseguirá apreender
o teu real significado.
Por mais que ele cante o amor, as lágrimas teimarão em
rolar por seu rosto descontente, já que o negror da tulipa é incognoscível, e descrevê-la não é possível.

*****

Misteriosa e fascinante é a flor Tulipa. Originária da Turquia, tulipan (que quer dizer, turbante) pertence a família dos lírios (liliáceas) e costuma florescer no fim da primavera. Reza uma lenda persa que, certa moça, Ferhad, apaixonou-se perdidamente por um rapaz, Shirin, que, entretanto, não correspondeu a essa louca paixão. Rejeitada, Ferhad fugiu para o deserto, onde ninguém a visse chorar e Ferhad chorava constantemente, dia e noite, de saudade, tristeza e solidão e cada lágrima vertida, caída ao chão, mal tocavam a areia, transformava-se em uma linda flor, a tulipa.
A tulipa negra, que na verdade possui a tonalidade marrom-escuro, é conhecida como “rainha da noite”. Assim como diz o poema, descrever a beleza com exatidão, não é possível. Motivo de inspiração a poetas e escritores, a exaltada beleza maravilhosa desta flor, perde-se no imaginário da humanidade na vã tentativa em decifrar os seus mistérios. Símbolo de perfeição, oculta, dentro de nossas almas, está a sua essência, misturada a nossa, em um casamento feliz e possível. Entretanto, poucos são aqueles que se dão conta deste milagre interior, pois a busca eterna por nós mesmos está, muitas vezes, centralizada apenas nos aspectos externos, deixando-se de lado o retorno positivo proporcionado pela natureza das coisas. Dentro e fora de nós, está a verdade, revestida de vários modos, em variadas formas, seja na imagem de uma criança; de um quadro, de um poema ou na forma de uma flor, portanto, descobri-la não é algo tão distante, e é isto que nos diz a preciosa tulipa, de negras pétalas aveludadas, cuja criação o homem, ainda, não foi capaz sequer de igualar.

sábado, 5 de julho de 2008

O PIRILAMPO



Revoluteava um gentil pirilampo num jardim florido, em bela noite de lua... e tão feliz estava que a luz que de si emanava, dissipava as sombras noturnas.
Porém, alguém que em tal jardim também se encontrava e além das flores observava o nobre pirilampo, não mais se contendo, perguntou-lhe: “Oh, luminoso pirilampo que bailas alegremente neste jardim florido, a competir com a própria lua o clarear da noite escura, por que não achas por bem, surgir à luz do dia também? És tão belo e gracioso que certamente serias notado e devidamente apreciado”.
Então, disse o pirilampo em resposta a quem o indagava: “Meu caro, à luz do dia eu simplesmente desapareceria... A beleza tão admirada em noite escura sob o esplendor do sol nem seria notada. Não ouso desafiá-lo... Tolo, não sou. Além de belo, sou sábio!”

***[1] Inspirado em um conto de Saadi de Shiraz; História de uma luciérrnaga, do livro EL BUSTAN; Ediciones DERVISH INTERNACIONAL

sexta-feira, 4 de julho de 2008

VIVER


Ele teve a sensação de ser. Não poderia explicar, tão profundo, nítido e largo que era. A sensação de ser era uma visão aguda, calma e instantânea de ser o próprio representante da vida e da morte. Então, ele não quis dormir, para não perder a sensação da vida.

***

A FOME: Meus Deus, até que ponto vou na miséria da necessidade: eu trocaria uma eternidade de depois da morte pela eternidade enquanto estou viva.

***

A REVOLTA: Quando tiraram os pontos de minha mão operada, por entre os dedos, gritei. Dei gritos de dor, e de cólera, pois a dor parece uma ofensa à nossa integridade física. Mas não fui tola. Aproveitei a dor e dei gritos pelo passado e pelo presente. Até pelo futuro gritei, meu Deus. 



(Do livro Aprendendo a Viver, Crônicas reunidas de Clarice Lispector, 2004,Editora Rocco)

quinta-feira, 3 de julho de 2008

O MALDITO

A música vinha das sombras, tocada por mãos invisíveis.Talvez a tocasse um demônio solitário que sussurrasse consigo a letra de alguma perdida canção.
Será que a solidão também habitasse o inferno?
Será que a tristeza doía no peito de demoníacos corações?
Ou será que no inferno, a paz, por vezes, descia, transmutando em alegria as eternas aflições?
De tanto olhar para a escuridão, quase que o vi sentado, debruçado sobre um negro piano.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

CAMINHAR SOLITARIERRANTE


Caminhava pela cidade. Fisicamente, era eu, em carne e osso, transitando por ruas que não eram novidades para mim, porém, por dentro, era outra a cidade por onde andava; uma cidade saída da memória. Ainda é cedo, mas o sol é inclemente, penso em quanto antes, alcançar a próxima esquina, lá aonde o vento faz a curva e em cada esquina, penso te encontrar... meu andar é quase arrastado, não por preguiça, mas por força de prestar atenção... na verdade, não presto atenção em nada, pois caminho pelas ruas de uma cidade dentro de minha memória. Casualmente, esbarro em alguém, que me obriga a deixar a cidade imaginária para retornar à cidade do lado de fora; alguém que pede desculpas e continua em seu caminhar... este alguém, que, como todos nós, de futuro incerto, talvez, mais tarde, estará vivo só na lembrança de quem lhe amou, de quem lhe quis bem, ou não, quem sabe mais tarde, partirá apenas em uma longa viagem, mas depois de algum tempo estará de volta, à segurança de um porto feliz... é quem sabe... quem sabe se ele já não é somente uma miragem.
Passo agora por uma antiga e enorme casa em frente à praça da Saudade... parece estar vazia no momento, sem ninguém, parece esquecida... O pátio, cheio de folhas ressequidas, e, dois gatos amigáveis, relaxados; um sentado e outro deitado; um branco e um marrom-cinzento (?) há um jardim também, pequeno e agradável muito bom para se viver... se eu fosse uma borboleta ou um pássaro, uma fada ou então um duende, ou ainda uma joaninha faceira ou uma abelha festeira...

ou ou ou ou ou ou ou ou ou ou ou OU ouououououououououououo...

A vida é feita dessa conjunção alternativa, mas cheia de possibilidades infinitas, por isso já dizia a meiga Cecília, Ou Isto ou Aquilo, questão de escolha my baby... pro mal ou pro bem há de saber quem? Assim, escolho retornar a minha cidade imaginária, porém, acabo percebendo que uma não está dissociada da outra, apenas parecem diferentes por causa das sutis modificações operadas pelos homens e pelo tempo ou será pelo tempo e pelos homens? Bem... a ordem dos fatores não altera o produto, não é mesmo?... Passo pelo Teatro, passo pelas gentes, passo pelas lojas; passo pelos carros, passo pelas casas, passo pela praça; passo pela calçada, passo pela avenida, passo pela vida? Passo como um fantasma... Passo, passo, passo... passo a passo... em compasso/descompassado... Tragicômica eternidade há no pensar ou no passar? Ora, passemos adiante... Passei...

terça-feira, 1 de julho de 2008

A SONÂMBULA



Sob a lua distante e fria, de olhos fechados ela ia à fonte se banhar.
Os pés, descalços, o macio tapete de folhas pisavam, e, serena caminhava, como se soubesse onde estava na noite enluarada.
Ao chegar à fonte, nua ficava e dentro d’água começava a brincar; os olhos se abriam e tudo em volta reluzia como gema preciosa... mas, dentro das sombras algo se movia, algo escuro e assustador e com olhar invejoso a donzela espia...
Eis que a beleza imprudente, na fonte brincava, a todo perigo indiferente.
O ser que nas sombras espreitava, não ousa se aproximar. Nas árvores, o vento gemia, porém, na fonte, a calma reinava; calma somente perturbada pela alegria da donzela, ninfa encantada sonhando na noite bela.
Fantásticas luzes coloriam as gotas d’água que da fonte caiam e aos pés do estranho ser iam parar; e ele, nelas, timidamente, se mirava, mas o que via não era a sua feia figura e sim a da ingênua donzela que na fonte brincava.
Atônita ficava a besta-fera que nas sombras sofria... Não compreendia que a beleza invejada, dela, também parte fazia, todavia, olhar em seus olhos não podia, tão distante parecia, e, então nas trevas permanecia...
A beleza distraída, na fonte brincava e nem se apercebia do que nas sombras se escondia.
Quando a noite findava e o primeiro raio de sol despontava, a donzela a fonte deixava e de olhos fechados, pelo mesmo caminho orvalhado retornava... inconsciente de seu destino, ela tarda em despertar...
E a besta que nas sombras espreitava, lá, bem dentro de si, sem saber ansiava, por ver a sonâmbula acordar...

domingo, 29 de junho de 2008

A ROSA, O CRAVO E O SOL



Uma rosa foi abruptamente arrancada de meu jardim.
Era uma linda rosa de cintilante cor vermelha e suave perfume; uma rosa muito especial.
No canteiro em que desabrochou, havia muitas outras flores, nenhuma, tão linda quanto ela, que, muito tímida, evitava qualquer aproximação. Temia o sol; amava a lua e era amiga apenas do vento e da chuva.
Entretanto o amor armou seu laço, e a linda rosa viu-se apaixonada por um orgulhoso cravo que só queria saber do sol.
Pobre rosa vermelha! A paixão lhe consumiu o coração e ela viu-se perdida, e mergulhada no desespero. Por causa disso, nem reparou no sol, que não amava o cravo, e sim, a rosa, tal qual à velha canção sobre José que gostava de Maria, que amava João...
O anoitecer enchia a rosa de esperanças, pois a lua, sua amiga, sempre a deixava mais bonita, mas o cravo, o orgulhoso cravo, não lhe deitava nem um olhar, nem um olharzinho sequer e, ao amanhecer, quando o sol buscava ansiosamente por um carinho da rosa, esta se recusava a vê-lo, acusando-o injustamente de ser o responsável pela fatal indiferença que lhe votava o desejado objeto de seu amor.
O cravo, ao perceber o interesse do sol pela rosa, do alto de sua arrogância, não suportou a rejeição e, por vingança, numa noite sem lua, seduziu e abandonou a bela flor.
A rosa, humilhada, ferida em seu amor-próprio por tão rude golpe, quis esconder-se de todos e, em seu infortúnio, não reparou que se inclinara demais para fora da cerca que protegia o canteiro. Alguém que por ali passava achou que ela seria a flor ideal para enfeitar um raro e antigo vaso de cristal e, assim pensando, caminhou em sua direção e bruscamente a separou do galho, pouco se importando com seus queixumes.
Apenas o sol afligiu-se com a sua dor e não deixou por um segundo a ingrata que cruelmente o ignorara. Perfeito no amor; paciente na dor, este maravilhoso amante, todas as manhãs, entrava mansamente pela janela e nas pétalas delicadas depositava um longo beijo sussurrando ao coração frágil e palpitante da amada seus ambicionados e inacessíveis segredos. E assim foi durante dias em que o sol preparou a flor para a sua remissão.
Devidamente preparada, quando o fatal momento chegou, a rosa, pendeu para o lado e suavemente, expirou.
As pétalas desfeitas, mas ainda perfumadas, foram parar dentro de um livro, enquanto o talo apodrecido teve por jazigo um simples saco de lixo. Porém, a alma imortal que a flor, tão duramente conquistara, ascendeu ao céu, amparada pelos tépidos e luminosos raios do sol.
O cravo orgulhoso teve um triste fim.
O inverno chegou carregado de chuva, e uma erva daninha cresceu ao pé da cerca em que ele costumava se apoiar. Em pouco tempo, ela adquiriu força e uma tremenda agilidade e, em um melancólico entardecer, subiu a cerca e enrolou-se ao pescoço do cravo, que, distraído e omisso como era, não teve a menor chance de pedir socorro.

sábado, 28 de junho de 2008

NÓ NA GARGANTA



Ouço os passos do fantasma que me persegue. Mesmo em casa, com as portas trancadas, ouço o ruído de sua risada... apesar do nó na garganta e do frio na boca do estômago, não me desespero, pois conheço esse fantasma e não quero que ele se vá.

Quem me dera, outra vez, sentir nos lábios, o beijo apaixonado que lembrasse à minha alma o quão já foi amada... mesmo que esse amor agora, seja só saudade que me aperta o peito e deixa meus olhos rasos d´ água.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

CENAS DE AMOR PERFEITO


Inicio da tarde... neste período de tempo há certa dificuldade para mim em conciliar meus pensamentos, não importa se faz chuva ou sol... lembro-me de outros inícios de tarde em que a alegria não demorava a chegar: um banho morno no chuveiro do pátio, entre canteiros de rosas e pássaros ou ainda um mergulho na piscina de plástico, brinquedo armado, pronto, sempre a esperar... o pé de acerola, carregadinho de frutos apetitosos e avermelhados... a sombra se estendendo, a crescer no quintal... o vento, ora forte, ora fraco passa, trazendo histórias em suas asas... a roupa a secar no varal... início de mais uma tarde de amor... o pequeno portão de ferro, quebrado, range quando o abrem... sinal de que voltou...correria, sorrisos, gritos de crianças, saudades, beijos e braços... o suor a escorrer pela face bonita e jovem, tristeza a se esconder no olhar... verdades atrozes... na vez, chuva grossa a bater no telhado de folhas de amianto, um sossego esparramado no aconchego do quarto, na cama quente entre lençóis perfumados, segurança, apenas um instante, nos braços calorosos de uma esposa-amante... a morte e a dor aguardam, inquietas, ao lado de fora ... dia seguinte, céu límpido, de um azul estonteante; o sol brilha tanto que ofusca a visão... o sol é belo, a vida é bela, mas, nada se pode ver devido ao clarão... a alma cega... a mesa posta, manhã ou tarde, café para quatro... a alegria está de volta... acordes altos de um contrabaixo... um bebê a chorar... uma canção de ninar... linda visão do futuro... eternamente... juntos... um doce entardecer... assim deveria ser... não há lágrimas que desbotem essas ternas lembranças... quadro familiar pintado por um deus esquecido, mas, invejoso do amor perfeito que, por breves instantes, por descuido, baixou à terra e, rebelde, desatinado, ao céu não mais desejou retornar...

quinta-feira, 26 de junho de 2008

UM


O homem, sentado à beira do barranco, em sossego, pita um cigarro de palha.
Seus pensamentos acompanham o rio que lá embaixo passa, ligeiro e certo, rumo ao seu destino.
Homem e rio se confundem, unidos na mesma solidão; solidários como velhos amigos que se reencontram depois de um longo tempo.

***

No verão,
partiremos rumo ao sol.
Minha sombra e eu.

***

Fim de noite...!
Perdem-se no ar
as cinzas de junho.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

EM BUSCA DO SOL


Lá vão eles, remando em suas canoas, deslizando suavemente pelo rio, varando a madrugada.
Eles, quem são eles?
São os índios Tupeba, que todos os dias, saem bem cedinho em busca do sol.
O sol que foge todas as tardes, deixando a noite cair, por isso, é preciso partir e outra vez trazê-lo de volta.
Quase perto do encontro das águas, encontram também o sol.
Feliz encontro!
Mais tarde as trevas virão, cobrindo tudo, e, novamente, eles sairão remando em suas canoas, deslizando suavemente pelo rio, varando a madrugada.
Talvez, para sempre, fosse assim.
Mas, ele veio, o homem de cabelos amarelos, o filho do sol.
Um dia, desceu do céu, trazendo consigo um estranho mensageiro; que batendo suas longas asas, cantava para chamar o dia.
E, desde então, os índios Tupeba não saíram mais tão cedo, remando em suas canoas, deslizando suavemente pelo rio, varando a madrugada...
Agora, ficavam muito descansados; deitados em suas redes, esperando ouvir a ave cantar.









terça-feira, 24 de junho de 2008

ENCANTAMENTO


Para Márcia

Que os peixes nunca te deixem esquecer.

Ela pensava enquanto pescava. De uns tempos pra cá, as coisas andavam esquisitas. Lembranças que não eram suas se sucediam em sua mente como cenas de um filme antigo, não conseguia livrar-se delas por mais que tentasse. Saíra para pescar justamente para ver se podia, ao menos, entendê-las. 

Era montar quebra-cabeças. Uma aragem fria sacode-lhe os castanhos e compridos cabelos, encrespando também as negras águas do rio, e de repente, ela sente medo. Uma escuridão, vinda não se sabe de onde, envolve tudo, como se uma noite sem lua despencasse do céu em plena tarde. 

Pronto! Fim da pescaria. Não há mais peixes, não há mais pássaros não há mais sol; iria embora. Mas como? Pergunta-se. Com todo esse pretume jamais acertaria o caminho. Teria de esperar! Encolhe-se na posição fetal, assim é que ela sempre ficava quando se sentia insegura. Devagar, fecha os olhos e novamente as lembranças retornam.

Primeiro é a vastidão da floresta, com índios correndo nus por todos os lados. Livres, tomando banho nos rios. São muitos: crianças, todos crianças, curumins e cunhantãs. Grandes nações dizimadas, escravizadas, enfraquecidas, absorvidas pela ''civilização'' do homem branco, quase nada restando, a não ser os nomes, bonitos e poéticos: Baré, Uapés, Tarumã, Tupeba, Manáo... Manaú... Manaus, ''mãe dos deuses'' e deuses é o que eles pensavam ser, os poderosos senhores da floresta. Quando eles, os invasores, aqui chegaram abriram na mata, uma ferida mortal. Bem no coração verde da floresta, o branco, o homem branco, ergueu uma aldeia, logo depois, uma vila e finalmente uma cidade. Uma cidade que foi, que vai, crescendo desordenadamente, com ruas tortuosas e esburacadas; ruas que rasgam a selva fazendo-a gritar de dor. Ruas que vão tomando o lugar dos igarapés, sempre cheias de animais que por ela transitam livremente; ruas de nomes curiosos: travessa da estrela, travessa do sol, travessa da lua, travessa das gaivotas. As casas surgem em variados estilos arquitetônicos, mistura de raças e culturas. Olhos tristes de longe vigiam os acontecimentos e não gostam nada do que vêem. Luzes brilham, mas não são os olhos da cobra-grande, é a luz elétrica que mexe com a cidade. Mais uma invenção do homem. Para ele já não basta a luz do sol, da lua, das estrelas ou dos românticos lampiões. Invenção do homem, do homem...

Uma magnífica construção eleva-se do chão. Elegante, majestosa, e é dentro dela que eles realizam os seus sonhos. É no teatro mágico, fabuloso, como fabulosa é a cidade idealizada para ser a ''Paris das Selvas'', Paris dos sonhos; sonho amazônico de grandeza de um louco? De um visionário ou de um simples ''Pensador?''1 Talvez todos eles juntos, reunidos no espírito empreendedor de um único homem. Sonhos! Não dizem que tudo é sonho? A realidade é sonho e agora tudo passou. O sonho virou pesadelo, a fábula acabou como uma história mal contada. Ela não é mais a “Paris das Selvas”; não é mais a Paris dos sonhos, ela ganhou feios contornos de modernidade.

A cobra-grande não desperta mais, provocando tremores e temores, abalando a fantasia popular com sua imensa e poderosa cauda. O boto namorador já não dança nos bailes em dias de festa, somente Anhangá passeia debaixo deste sol, cada vez mais moreno, cada vez mais feliz. Os bons espíritos da floresta perderam seu lar e tiveram de se adaptar a nova realidade. Andam pelas ruas esquecidos de si, acreditando que são como uma gente qualquer. Esquecer e serem esquecidos.

Por fim ela compreende que as lembranças sempre foram suas, lembranças de quem sempre habitou este mundo verde desde os tempos sem memória. No mesmo instante dissipa-se a escuridão, então, se levanta e despindo-se da pele humana que vestira por muito tempo, mergulha na água de volta para casa. Os peixes ensinaram-lhe o caminho de retorno. Parte, deixando atrás de si um rastro de prata nas águas escuras do rio, enquanto se acendem as luzes, na cidade cada vez mais distante.

***

1 Pensador: Assim era chamado o então governador Eduardo Gonçalves Ribeiro.

domingo, 22 de junho de 2008

FESTA DO BOI BUMBÁ OU PAVULAGEM



A leste do Amazonas, precisamente a 325 Km de Manaus, se encontra, sob a benção de Nossa Senhora do Carmo, a padroeira, o município de Parintins, a ilha do folclore, assim conhecida por abrigar durante os dias 28,29 e 30 de junho a maior festa folclórica do estado, quiçá, do país. Perdendo apenas para o carnaval, a festa do boi-bumbá, é também conhecida por pavulagem, que no dizer do caboclo da região, significa gabar-se, contar vantagem.
A “ilha Tupinambarana” (falsos tupis) outro nome pelo qual Parintins é chamada, situa-se à margem direita do rio Amazonas e é formada por uma população de espírito moderno e empreendedor, vibrante, que detêm nos bois Garantido (vermelho) e Caprichoso (azul), as suas maiores paixões. Divididas em torcidas, nos dias de festa, a rivalidade chega ao extremo de se pintar a casa ou só se vestir com roupas da cor do boi de sua preferência.
A festa de boi-bumbá veio do Maranhão, que lá era chamada por bumba-meu-boi, com os primeiros imigrantes que aqui na Amazônia vieram se instalar, tomando desde então, devido à miscigenação existente na região, características próprias. Mas, apesar de afluírem para a “ilha dos falsos tupis” grandes levas de turistas não é só em Parintins que se respira folclore ou brinca-se de boi-bumbá, em Manaus, ainda é viva e forte a tradição desta dança dramática preservada com muito carinho no seio das comunidades e nos bairros. A morte e a ressurreição do boi são os pontos altos dessa festa magnífica, encenada nas profundezas da Floresta Amazônica, é o canto do branco, do negro e do índio misturados aos cantos dos encantados, dos pássaros e outros bichos, pedindo passagem para que o mundo ouça a sua mensagem e que, ao volver o olhar para esse mítico “paraiso/inferno verde”, pense que é preciso e possível a preservação, é possivel um futuro promissor, "garantido" e "caprichoso", duradouro, para nós, para todos.

sábado, 21 de junho de 2008

AURORA [1]



“Ai, que dia mais quente!”. Assim dizia o menino consigo enquanto tirava a camisa.
Ele caminhava às margens de um riacho em que crianças nadavam aproveitando o calor da manhã. A água, limpa e fria, era um convite tentador.
Dali de onde estava podia ver as casas em construções, imitando os velhos estilos europeus. Eram bonitas. Algumas possuíam janelões, com sacadas cobertas de flores.
O menino tem uns dez anos de idade. É inteligente e imaginativo; observa as coisas com muita atenção, tirando por fim suas próprias conclusões. Ele está sempre aprendendo.
Naquele dia não foi à escola e seguiu em direção ao riacho. Estava quase pulando n'água, quando, de repente, o barulho de uma porta fê-lo olhar para os lados da casa mais bonita, e de pé, na sacada, viu uma linda menina; linda de um jeito que nunca vira na vida.
Trazia nas mãos um jarro com o qual pôs-se a regar as flores e ao se inclinar, os longos e finos cabelos cobriram, como um véu, o seu delicado rosto. Era a própria deusa Aurora, radiante, perante as portas do alvorecer.
O menino, não podendo mais suportar o calor, refugiou-se à sombra de um muro, porém, na verdade, a visão inesperada afetara-o mais que o sol abrasador. Ele queimava por dentro. Em seu coração sentiu uma sede que nunca, nada poderia aplacar e sentiu também uma imensa felicidade. Uma leve brisa soprou, espalhando um suave perfume que ele, atordoado, não soube dizer se vinha dela ou das flores que regava. Devagar fechou os olhos e saboreou a doçura da descoberta do primeiro amor.


***Inspirado em Saadi de Shiraz, El Jardín de las Rosas; Décimo quinto cuento

sexta-feira, 20 de junho de 2008

TAMBATAJÁ [1]


Amasuru, índio da tribo Macuxi, além de grande guerreiro, era belo e inteligente, pois os deuses o haviam agraciado com todas as graças que pudessem ser concedidas a um mortal. Mas um dia, enredado pelas artimanhas de Rudá, o deus do amor, o guerreiro apaixonou-se perdidamente por Jaciara, a filha do pajé.
Realmente, em todo Imenso Vale Verde não havia beleza igual. Cabelos longos, negros e brilhantes, emolduravam um rosto que de tão rosado parecia besuntado de urucum
[1].
Para felicidade de Amasuru, Jaciara também o amava e diante desse fato, foi acertado o casamento.
Depois de casados, marido e mulher viviam felizes, devotados que eram um ao outro.
O tempo passou e tudo ia bem até que o guerreiro precisou se ausentar. Uma sangrenta batalha o aguardava. Amasuru, que não queria saber de matanças desde que conhecera o amor, chorou bastante. Mas, por questões de honra, sendo ele o mais bravo e o mais forte, precisava ir.
Pegando as armas de guerra, subiu na ygar
[2] juntando-se aos outros, rapidamente desaparecendo nas curvas do rio.
Jaciara lamentava-se noite e dia. Perdeu o rosado do rosto e caiu doente. O que seria dela se Amasuru não voltasse?
No clamor da batalha distante, o guerreiro lutou com a força do desespero, matando muitos, pois queria, o quanto antes, voltar para casa.
Numa noite de lua cheia, o povo da aldeia Macuxi, ouviu ao longe o canto do inybi-á
[3]. Eles voltaram, mas Jaciara, doente como estava não pôde levantar-se. Amasuru, ao procurar sua amada e não encontrá-la em meio à gente, acorreu rapidamente à sua oca. Lá estava ela, ainda deitada e ardendo em febre. Seu pai, o velho pajé, desistira de suas pajelanças e procurava acalmar os delírios da filha.
Preparou-se uma festa, onde Amasuru seria o maior homenageado. Não compareceu, o que apenas lhe importava era ficar ao lado de Jaciara.
Naquela mesma noite, pela madrugada, Jaciara melhorou e ao contemplar o amado, as cores e o sorriso lhe voltaram, e durante algum tempo, o casal tornou a ser feliz. Para não mais deixá-la só, enquanto se recuperava, Amasuru teceu uma tipóia, onde a colocou, amarrando-a as costas, levando-a assim para todos os lugares.
Mas o contentamento teve a duração do tépido calor da manhã.
Certa feita, Amasuru, sempre carregando a tipóia, resolveu dar um passeio num lugar bonito, cheio de beija-flores, que só ele conhecia. Pelo caminho foi conversando com Jaciara, enquanto ia recolhendo água, flores e alguns frutos. Porém, ao chegarem no dito lugar e ao desamarrar a tipóia, o jovem índio constatou que Jaciara estava morrendo. Só teve tempo de retirá-la e ampará-la nos seus braços.
Tomado pela dor carregou seu corpo, embrenhando-se por dentro da floresta. Parou à beira de um riacho, onde, com suas próprias mãos, cavou uma sepultura. Depois, baixando o corpo da esposa, deitou-se ao seu lado, lá permanecendo até o fim.
Grossas chuvas despencaram, empurrando a terra que, aos poucos, foi cedendo e cobrindo os amantes. Amasuru olhou uma última vez para o céu. Um raio iluminou a escuridão, e o coração do jovem guerreiro se aquietou. Tupã havia aceitado seu sacrifício.
No retorno da lua cheia, em cima da sepultura, brotou um pé de planta, de folhas triangulares, de cor verde escuro; trazendo em seu verso uma outra folha de menor tamanho. É o tambatajá, a qual os índios e os caboclos da região atribuem poderes místicos.
Nas casas em que há amor, a planta cresce viçosa. Se na folha grande não existir a pequena é sinal de que não há amor, e se acaso apresenta mais de uma folhinha, então é porque há infidelidade entre o casal.

*********
[
1] urucum: fruto do urucunzeiro, em que, da polpa, se extrai um corante vermelho.
[2] ygar: canoa
[3] inibi-yá: espécie de cornetim

Do livro MORONETÁ-Crõnicas Manauaras, Virgínia Allan, Editora Valer

quinta-feira, 19 de junho de 2008

DESABAFO


Gerei meu assombro ao divisar teu rosto entre um açoite de lembranças esquecidas. Dominou-me a amargura, cansado que estava em chamar teu nome. Aborreceu-me, então, o silêncio da noite.
Pensei em começar uma nova história em que fosses tu o principal personagem, porém teus atos traíram tuas palavras e dei-me conta, de repente, que, outra vez, mergulharia na mais banal das situações.
Letargia! Estou cansada dos rostos que se escondem sob as máscaras que não escondem nada... Será possível, meu Deus, que não haja, neste mundo, um ser real, um ser de verdade? Que não seja de plástico? Serão mesmo todos iguais...?! Decepção... Ó mundo, maldita fábrica humana de bonecos.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

terça-feira, 17 de junho de 2008

PROSA



Acho que alguém já disse que escrever é como tecer um tapete ou coser uma roupa... É bela e romântica a comparação...
Descobri outro dia, entre velhos papéis dobrados, rascunhos de desenhos e textos esquecidos, uma bela história escrita num antigo caderno de escola. A minha história... Nossa... fazia tanto tempo que o caderno estivera ali escondido que por pouco não o rasguei e joguei-o fora, quase ignorando a voz insistente, mas amiga, que não cansava de sussurrar em meus ouvidos para que não fizesse isto... Cedi, é claro, à minha intuição seria, realmente um gesto insensato, mas agora estou em dúvida se a conto ou não... A minha história é tão bonita, tão rica de detalhes e tão transparente... só não lêem os segredos revelados nas entrelinhas aqueles que nunca amaram ou nunca se libertaram de conceitos estereotipados...

PAUSA para pensar hummm... Pensando... Pensando...?!?!....Huuuummmm!

Não.... para o desconsolo de todos que apreciam conhecer um segredo, decidi-me por não contá-la , é pessoal demais para espalhá-la por aí, aos quatro ventos, então, sinto muito, mas a guardarei para mim... Por enquanto, porém, para que não morram de curiosidades, ou de inveja, limitar-me-ei aqui, apenas a contar sobre o tipo de material do qual é composta (a sua descrição, por si só, já garante uma boa dose de encantamento) um material especial do qual são tecidos todos os sonhos, como diria um famoso poeta inglês, uma vez que a minha história transpôs o papel e ficou pairando no mundo irreal (ou ideal?) e um tanto frágil da inevitabilidade das idéias...
Primeiramente, a fim de chamar a atenção, um fino e brilhante revestimento de palavras e frases de gentilezas vê-se logo na introdução, a costura, feita a mão, de um modo raro, entra e sai num alinhave de letras perfeito, unindo e reforçando os pontos de ação que não podem nunca ficar separados para dar boa impressão.
No meio do tecido, um bordado de suspense e romance, mesclado a um bom reforço com as fortes linhas do drama, entrecortado pelas finas linhas coloridas do riso, e justamente neste exato momento uma lágrima furtiva se aproveita, e perfurando o bloqueio anti-sensibilidade, escorre, manchando o tecido onírico, levemente amarelecido.
De uma linha a outra, na continuidade da costura cuidadosa, um perfume de lembranças, saudades ignoradas, nos assaltam e, pegos desprevenidos, somos obrigados a fechar os olhos e parar, outra vez, por mais um longo instante a fim de ouvir e entender o silêncio, e, como é uma costura comprida e ainda sem fim está repleta de pontas soltas.
O mistério da perfeição do tipo e modelo do tecido, se encontra nos pontos de exclamação e interrogação... para se poder entendê-lo, deve-se antes lapidá-lo como se faz com a pedra preciosa, pois, é somente depois desse árduo trabalho, que o entendimento reluz como as luzes maravilhosas de um glorioso dia de sol; é exatamente deste mistério que são feitos os preciosos botões mágicos que enfeitam o tecido, levemente amarelecido de minha história, que abrem e fecham as casas de nossas ilusões e doces pensamentos...

domingo, 15 de junho de 2008

FRAGILIDADE



Meu coração teima em ficar feliz só de ouvir a tua voz.
As aflições que me perseguem desfazem-se ao som de tua voz
O vento, a chuva, o sol, perdem a força, a importância e a cor ao som de tua voz.
Tua poesia misturada a minha melancolia elevam o meu ser até a uma fonte real de poder.
Sou menina, sou mulher ao som de tua voz.
Se não te ouço; se não te vejo, cai em mim o anoitecer. E muda não me satisfaço, pois somente em ti tenho prazer.
Arranca o gemido de minha boca e o segredo de meu coração. Minha alma implora por tua alma. Meu corpo implora por teu corpo, não apenas pelo gozo ansiado, mas pelo toque há tanto esperado onde alguém, único, desfaria para sempre as cortinas de ilusão.
Ainda cruzo um deserto e talvez sejas tão somente uma miragem ou então seja apenas o pálido reflexo dos meus desejos mais recônditos que me é devolvido pelo negro espelho da noite, ou o frio desse deserto que nunca me abandona, resolveu me assombrar e mandou-te, demônio, em forma de homem, sedutor e distante.
Sim... creio agora, que sejas mesmo tão somente um demônio ou uma miragem para que eu, na ânsia em fugir de ti ou de alcançar-te, vá cada vez mais para longe... de mim.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

QUIS BRINDAR-TE COM UMA CANÇÃO



Quis brindar-te com uma canção e deixei que o coração a começasse.
O coração rimou com a paixão, que desesperadamente voou para o aconchego dos teus braços.
Teus braços a envolveram, mas não suportaram a angústia de viverem entrelaçados e relaxando o abraço, deixou-a solta, vagando perdida no espaço.
A paixão muito chorou, mas sumiu, misturada à poeira do infinito!

quinta-feira, 12 de junho de 2008



Querido,

Espero que, onde quer que tu estejas, de alguma forma, possas zelar por nós. Meu amor, custa-me ainda aceitar seguir a vida sem ti. Eu não entendo (e talvez, jamais entenda) os motivos que te levaram a concluir teu destino de uma forma tão prematura e insensata. Penso que se tivesses resistido mais um pouco, um pouquinho que fosse, cairias em ti, e as nuvens negras que nos atormentavam passariam ao largo, levando para longe a violenta tempestade que ameaçava desabar sobre nós. Porém, as nuvens negras permaneceram, e a tempestade, enfim, desabou, mas somente sobre a minha cabeça. Ninguém mora mais em nossa casa; cortaram nossa roseira e tudo ficou frio e sem cor. Sinto tanto a tua falta... tuas filhas também. Os dias passam; e o tormento do qual tento me livrar sem muito sucesso, ainda é o mesmo, tudo me lembra você... e o que fazer com tanta dor? Todos diziam que isso iria passar, era só dar tempo ao tempo, mas, infelizmente, não sinto isto acontecer.
Anna Clara, a Danda, o nosso baby sol/baby soul está tão engraçada... Cada dia mais inteligente. Luisa, cada vez maior, bonita e esperta. Com o tempo, administrará sua vida (se Deus quiser) no caminho que lhe indicamos e de uma maneira melhor e mais produtiva que a nossa. Vê-la crescer dessa forma me tranqüiliza, pois além de poder cuidar de si mesma, saberá cuidar também de sua irmã.
Quase nada se modificou desde que te foste. O Brasil, e o resto do mundo continuam turbulentos e as perspectivas de um futuro não são nada animadoras. Tento deixar de lado meus sombrios pensamentos, mas não tem sido nada fácil. Sei que nunca terei respostas para o teu gesto insensato, todavia, indago-me o porquê dessa tua atitude todo santo dia. Algumas vezes sinto-me traída e custo a te perdoar... deixaste-me sem esperanças, com duas crianças pra cuidar e um caminho solitário a percorrer.. de qualquer forma,feliz dia dos namorados. Peço a Deus, Senhor dos Mundos, que me dê aceitação, pois somente assim eu terei um pouco de paz. Para ti, peço apenas que Ele te complete e te ilumine; para que, enfim, de volta ao caminho correto, possas obter o Seu perdão.

Com Deus
Com amor
Daquela que não te esquece

quarta-feira, 11 de junho de 2008

LAYLA E MAJNUN [1]



Desde que te perdi, não sou mais a mesma. Tu te foste, e tudo escureceu ao meu redor. Para mim, não há mais dia ou noite. Tanto faz se o sol brilha lá fora ou se desaba uma tempestade. Nada vejo.
Lembra-te de como éramos felizes? Muitas vezes ficávamos em silêncio, estudando o vôo dos pássaros ou observando os campos floridos ao nosso redor; brincando com os pequenos animais que passeavam sob o sol, o mesmo sol que te acariciava e te enchia de graça e beleza.
Minha vida sem ti, não é vida. Perdi-me de mim, pois só conseguia reencontrar-me diante de ti. Minha paz repousava em teus olhos; em teus meigos e amados olhos; tão castanhos... Neles, somente neles, é que eu podia contemplar a razão da verdadeira existência, pois vendo a ti via também a mim.
Dói-me saber que não posso mais de ti me aproximar. O amor ainda me queima; sou como uma vela cuja chama teima em não se apagar... Procuro acalmar esta dor com a música de minha flauta. Os animais, ao ouvirem o tom queixoso que dela sai, tomados pela compaixão, vêem e deitam-se aos meus pés e escutam com especial atenção nossa breve história de amor.
O vento balança as folhas das árvores que me cercam, mas o vento nunca me perturba, é sempre bem-vindo, pois me traz notícias de ti e o aroma de teu perfume... e depois ele dança...dança...dança... dança num alegre compasso a triste melodia.
Estou louca? Estou... Já que digo e repito que tu eras o próprio amor, e eu, apenas uma amante desvairada. Soubeste amar muito mais do que eu. Trazias-me trancada dentro de ti; em teu coração; nas profundezas de tua alma. Amavas em silêncio, enquanto eu impunha ao mundo o meu completo desespero e agora, o meu espírito não suporta mais a tua ausência.
Ainda somos um?
*****[1] Texto alusivo a uma história de amor, célebre no Oriente, do poeta sufi Nizami. Layla significa “noite” e Majnun, em árabe, “louco”.

terça-feira, 10 de junho de 2008

TENTATIVA




Não sei escrever poemas de amor.
Posso apenas dizer que te amo de viva voz, ao pé de teu ouvido, quando junto a mim te deitas e me falas baixinho.
Não sei escrever poemas de amor; desculpe-me. Este foi o único que tentei, mas os versos não vieram!
Porém, posso dizer que te amo de viva voz, ao pé de teu ouvido, quando junto a mim te deitas e me falas baixinho.

***

Que fazes aí, querido, sozinho nesta escuridão? 
Vem. Dá-me a tua mão e senta-te aqui comigo.
Esquece a tempestade que se forma lá fora. 
Amanhã, tudo já terá passado e tu, hás de reparar no brilho do sol. 
Agora, eu só quero te abraçar; sentar-me em teu colo e contar-te uma longa história.


segunda-feira, 9 de junho de 2008

DO AMOR ROMÂNTICO




Escuta, amiga e senhora minha, este teu bravo e gentil cavaleiro, que tendo percorrido terras do mundo inteiro, e vivido aventuras das mais intrigantes, deita aos teus pés os despojos da mais terrível batalha.
Saiba, amiga e senhora, foram para ti todos os meus pensamentos, devotadas a ti todas as minhas horas, incansável na refrega subjuguei-os por amor ao teu nome.
Por isso, não olvidarão jamais, este teu bravo e gentil cavaleiro, não olvidarão jamais, este teu doce e perfeito nome.
Pela verde planície em que vivi tão delirante aventura, para sempre se escutará, no rumorejar do vento, agitando as folhas das árvores, a canção do passado que se tornou presente.
Este será o meu legado para as gerações futuras, que elas possam cobrir o que deixei faltar. Se eu falhei como herói, não falhei como cavalheiro.
Que aquele vento, que sopra eternamente na verde planície, agitando as folhas das árvores, cantando a minha canção, possa me redimir.
Agi com as melhores das intenções, porque sempre fui fiel ao que acreditei.
Este vosso bravo e gentil cavaleiro foi fiel, porque sempre acreditou no amor.
Agora desejo somente o repouso. E a paz, que tão ferrenhamente busquei, possa me abrandar as penas. Que ela me envolva e faça calar o mundo.
Que eu ouça apenas a tua voz, amiga e senhora, e assim possa esquecer, ao menos por uns momentos, o que não mais poderá ser esquecido.

Cantilena do Corvo

EE-SE BLUE HAVEN

Ee-se encontrou Ahemed na saída de Hus. Dirigia-se ela aos campos de refugiados, nos arredores de Palmira, enquanto Ahemed seguia com seu pa...