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quarta-feira, 18 de novembro de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-SERINGAL MIRIM


SERINGAL MIRIM



Baseando-me na pesquisa de Robério Braga (*) sobre o Seringal Mirim, posto que a memória traiçoeira de alguns moradores daquele tempo, ainda vivos, não me permitiu levar tudo em consideração, fiz um resumo dos acontecimentos relevantes que culminaram, enfim, com o desaparecimento do lugar em questão.

De acordo com minhas próprias lembranças, o Seringal Mirim de minha infância já estava em franca decadência, sem o colorido festivo do boi bumbá Mina de Ouro, pouco restando das seringueiras que por um longo período foi a semente mágica enriquecedora que engrandeceu e enobreceu a cidade, elevando-a a categoria de Paris dos Trópicos no auge da Belle Epoque.

Assim como um segredo que não se sabe se deve ser espalhado, aberto a todos, o bairro de São Geraldo guarda em seu seio, como um conto de amor, a bonita história do Seringal Mirim, que juntamente com a Praça 14 e o Boulevard Amazonas, é considerado um dos primeiros redutos de escravos fujões, escravos estes que deram inicio de modo um tanto conturbado, devido ao percalço da vida de perseguidos a comunidade afro-brasileira na região, que trazia consigo, como bagagem, além da coragem, apenas seus santos, suas festas, suas brincadeiras e todas as suas mais diversas formas de manifestações. Oxossi, Senhor das matas, orixá da caça e da abundância, certamente sabia o que estava fazendo quando os encaminhara para cá com a promessa de segurança e bem-estar. No Amazonas, a compra e venda de escravos era um processo assaz esporádico.

Em 24 de Maio de 1884 foi feita uma declaração pública de Libertação dos Escravos em Manaus e no mesmo ano, em 10 de Julho, são declarados livres os escravos no estado do Amazonas.

Sabe-se que por um longo período de tempo, a base de nossa economia foi à extração e comercialização da borracha, assim todos os esforços possíveis eram empregados no sentido de promover e fortalecer cada vez mais nossa única fonte econômica.

Com este propósito, após um apurado estudo para o plantio da seringueira, promovido pela Associação Comercial do Amazonas, (fundada em 1871) sob o incentivo do então comendador José Cláudio Mesquita, foi criado o Campo Experimental do Seringal Mirim, em que foram plantados mais de cem pés de seringas. Ficou estipulado o dia 24 de Junho como o dia da seringueira e todo ano, nessa mesma data, se faria o plantio de uma muda.

Por essa época ainda não se cogitava a quebra total do mercado e nem o esvaziamento da cidade, fatos estes que se sucederam algum tempo depois. Mas, antes disso, o Seringal floresceu e permaneceu ativo por muitos anos, mesmo depois do falecimento do comendador Cláudio Mesquita (embora este fosse oriundo de terras lusitanas, foi um grande incentivador dos estudos e do plantio da hévea brasiliensis) ocorrido em 06 de Novembro de 1923.


Em 1937, o Seringal Mirim esbanjava beleza e exuberância e dois anos depois, em 1939, tentando obter a benção do Ministério da Cultura, o governo do Estado pensou em dele tomar posse.

Mas, saltemos alguns anos adiante e cheguemos logo em 1943, já na jurisdição de Álvaro Maia. Neste mesmo ano, em 19 de Abril, foi criada a Escola de Seringueiros José Cláudio Mesquita, passando esta, desde então, a integrar o Serviço de Fomento Agrícola do Estado, sob a direção do agrônomo Lourenço Faria de Mello, passando o Seringal a funcionar como uma Escola de experiência de látex.


As dificuldades, como sempre, acossavam os mais pobres e as lavadeiras e viúvas da região eram amparadas pela família do conhecido político Ruy Araújo, a saber, sua esposa Helena Cidade de Araújo, e seu irmão André Vidal de Araújo, assim não tardou que o governo acabasse por criar a Vila Assistencial da Praça Liberdade que não ficava exatamente no Seringal, mas sim em uma área vizinha.

Em 18 de Junho de 1979, via decreto 4590, graças a motivos apresentados pelo historiador Robério Braga a Comissão do Patrimônio Histórico, a área do Seringal foi transformada em reserva fundiária estadual e destinada à instalação do Museu do Seringueiro, infelizmente, tal projeto, que chegou a ser desenvolvido, sequer saiu do papel.

No ano seguinte, em 1980, o asfalto chegou à região, expulsando, de vez, através da exploração imobiliária o espírito do Seringal Mirim.

A avenida Djalma Batista, antiga Cláudio Mesquita, iniciada na administração do prefeito Jorge Teixeira, dividiu o Seringal, intensificando-se as invasões de terra.

Hoje, em lugar das árvores, há prédios, casas, praças, escolas, Bancos e a Central de Energia Elétrica que ainda, segundo Robério Braga, na época em que era vereador de Manaus (1989-1982) juntamente com outros parlamentares, tentou interditar a construção para que houvesse uma preservação da memória, porém, nada foi possível fazer devido à falta de documentação.

Do antigo Seringal Mirim resta-nos doce lembrança do cordão das lavadeiras e da presença marcante do “Batuque” Ilê de Santa Bárbara, como um coração vivo; pulsante, localizado à rua João Alfredo, seguindo duas linhas religiosas, primeiro o Candomblé e depois a Umbanda, dando, dessa maneira, maior ênfase ao sincretismo religioso que une a todos e que perdura até aos dias de hoje. Toda a cultura afro-brasileira, com seus cultos e folguedos, lá foram representados e reverenciados.

Há poucos anos atrás, os tradicionais festejos em honra aos orixás, identificados para proteção de sua religião com alguns santos do panteão Católico Apostólico Romano, como Santo Antonio, São Benedito, São João, São Cosme e São Damião, São Jorge, Santa Bárbara, Santa Luzia, eram comemorados com tamanha efusão que era quase impossível, não deixar de passar no terreiro, que, antes, estava sob os cuidados de Maria Estrela, mas, que depois passou as mãos de Joana Papagaio em seguida à mãe Margarida, e, por último, a Ribamar.

O Boi-Bumbá Mina de Ouro tinha o seu curral em frente à esquecida praça da Liberdade, em um terreno vizinho ao Seringal e a dança do Papagaio (muito tempo depois do bumbá) foram destaques nos festejos que aconteciam em plena rua.


(*) RB é historiador, ex-presidente da Academia Amazonense de Letras presidente do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas, Secretário de Estado da Cultura, Turismo e Desporto.



domingo, 15 de novembro de 2009

ANDORINHA



Andorinha de asa quebrada e coração partido

Bebe a água fria da fonte.

Chegou o tempo que parecia tão longe

De retornar ao cume além do monte

Logo esquecerás, andorinha,

O cansaço desta longa jornada

E a dor e a tristeza

Da despedida que te mata...

Segue, breve esquecerás o tormento dos homens...

E só ouvirás, andorinha,

A cantiga perdida da fonte

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

E A VIDA É ASSIM?



E A VIDA É ASSIM?




Nelinho ajeitou o cabelo, puxou a blusa, deixando-a meio dentro, meio fora da bermuda, calçou os chinelos, saiu do quarto, abriu a porta, e, mal respondendo a pergunta da mãe, dirigiu-se a casa em frente. Com cuidado, rodeou-a e entrou pela janela aberta.
Ela já estava à espera em cima da cama, metida numa lingerie sexy, vermelha como sangue e mal esperou que Nelinho tirasse a roupa. O prazer do proibido é tanto maior quanto maior o perigo.
Elisa era casada com um sujeito trabalhador e meio marrento, um empresário de sucesso no ramo dos livros. Não era infeliz, mas gostava de abusar de seus atributos físicos e mentais, pois além de bonita era inteligente e como quase toda pessoa inteligente e narcisista, subestimava a inteligência de quem supunha estar a enganar.
Os comentários do romance entre Nelinho e Elisa, correram soltos e acabaram por chegar aos ouvidos do marido, que era corno-manso não por vontade própria, mas apenas por nada saber... Bom, até aquele momento... Não era a primeira vez que ouvia sobre Elisa esse tipo de comentário, claro que nunca comprovados posto que jamais fizera caso, entretanto, desta vez, “uma pulga atrás da orelha” estava a importuná-lo. Se tudo fosse verdade, o caso estaria com os dias contados. Debaixo de suas fuças, Elisa, nem ninguém, nenhum sujeitinho de m... iria fazê-lo de trouxa.
Pensando em dar o flagra, fez o que todo marido enganado costuma fazer. Disse que ia passar o dia todo fora e só voltaria ao anoitecer. Em vez disso, esperou na esquina, fingindo tomar um café. Quem o via ali, muito desconfiava o que estava prestes a acontecer e ficavam por perto, ressabiados, prontos para a consumação dos fatos.

Elisa foi que nem desconfiou de nada. Notara a mudança de humor e os olhares sombrios do marido, mas nada que abalasse sua fatal confiança em si mesma. Geraldo era assim de nascença. Conhecia-o bem. Cego de espírito, por isso tinha aquele jeito de olhar carregado, esquisito. Desde que o caso com Nelinho começara desdobrara-se em carinhos e cuidados com o marido, mas nada de consciência pesada, agia dessa maneira justamente pra não levantar suspeitas.

Bom, quanto aos buchichos da vizinhança (estava ciente deles) nada poderia fazer e depois ninguém podia provar nada. Caso chegasse aos ouvidos de Geraldo e ele viesse lhe perguntar, sorriria daquele jeito só seu e diria que era inveja, já que, por aquelas bandas nenhum homem tinha mulher mais bonita que a dele. Acontecera isso antes e Geraldo, graças a Deus, engolira a mentira e além do mais, não era homem de dar ouvidos aos boatos. O dito “onde há fumaça há fogo” só se aplicava aos negócios, nunca à vida prática.

Pensando assim, Elisa largou-se sem preocupações a enfeitar a cabeça do marido. Nelinho, seu jovem amante, não era pra qualquer uma. Era um deus grego. Forte, alto, saudável, louro... enfim, um deus. Quem, em sã consciência, e amadurecimento sexual, deixaria um cara como esse escapar...

Elisa possuía um furor que Geraldo não era mais capaz de conter. Elisa precisava algo mais do que amor. Elisa precisava de satisfação, com alguém satisfeito é mais fácil de se conviver, satisfação gera felicidade; felicidade pra ela, pra Geraldo e pra quem mais estivesse ao redor. Ser/estar feliz era a sua meta, a sua ambição e ser/estar feliz viria da satisfação. A vida era muito curta, então ela curtia a vida pra valer. Não queria o fim de seu casamento, queria apenas satisfação, estando satisfeita, Geraldo ficaria satisfeito também e tudo estaria sempre bem.

Nelinho por sua vez, oportunista nato, era o herói da turma por esta última façanha, Elisa era mulher troféu de deixar qualquer um com água na boca, precisando de babador. Nelinho enredou-se na aventura, mas pelo gosto de proibido, pra se mostrar pros amigos, do que propriamente pela paixão ou os atributos físicos de Elisa. Era bom pegar o que era de outro, claro, sem o outro saber... um cleptomaníaco de emoções e sentimentos humanos. Outros dariam nomes menos românticos, como, por exemplo, traição.

Nelinho e Elisa deleitavam-se nos prazeres da carne, entre gemidos e gritos que, Geraldo, do canto em que estava podia ouvir. Era vergonhoso demais.
Sem mais esperar, saiu do bar feito um louco e rumou para casa onde meteu o pé na porta, rapidamente dirigindo-se ao quarto.

Nelinho e Elisa assustaram-se com a súbita interrupção e olharam para Geraldo que, de arma em punho tencionava “lavar a honra com sangue” e foi o que fez. Disparou tiros, que foram, pelo menos dois, certeiros em Elisa, os outros perderam-se na intenção de matar Nelinho.

Nelinho, sem questionar a sorte de plantão, pegou a blusa e correu, nem tendo tempo de pegar a bermuda que ficara jogada em cima do criado mudo. Correu, mas não encontrava saída. Foi para a cozinha, onde uma cancela de madeira era a única barreira a separá-lo da liberdade.

Geraldo correu também, atrás do jovem e alcançou-o... largando a arma, que estava sem balas, pegou a faca peixeira do faqueiro em cima da pia e antes que Nelinho pudesse pular ou abrir a cancela, acertou- lhe uma facada nas costas. Nelinho caiu, enfraquecido pelo golpe, com o peito exposto, Geraldo desferiu-lhe mais uma facada, direto no coração.

Assim morreu o jovem deus grego, que era uma lenda entre os seus. Morreu aos 18 anos, por um capricho, nu, da cintura para baixo, no soalho da cozinha de um marido traído.

Elisa não morreu. Ficou paralítica da cintura pra baixo.
Geraldo foi levado a julgamento, mas absolvido pela alegação de que “matara em legitima defesa da honra”. Naquele tempo ainda se usava, e se aceitava, tal alegação.

Pouco tempo depois, Geraldo e Elisa tornaram a voltar, tornaram a viver juntos, outra vez como marido e mulher.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-QUINTA ESTAÇÃO


QUINTA ESTAÇÃO


Anibal Beça




Não há recomeço possível.
Senão um olhar para trás.

A flor que murcha cai
não torna para o galho.

Por cima dos ombros
o outono perde a primavera
e as folhas secas
são tapetes grados
para amaciar pegadas.

Um murmúrio bate à nossa porta
e o vento inexorável
escarifica cicatrizes
no exato arrepio.

No pressentido encontro
- bandido convicto -
assalto o canteiro
dessa noite insone
e agasalho a alba
na gruta do sésamo.

terça-feira, 18 de agosto de 2009






"I am your voice echoing off the walls of GOD 
(Rumi)

(Inspirado em Jalaludin Rumi)


Tropecei nos mistérios de ser gente
Sacudi o mar e as montanhas em busca de respostas
Havia no azulado do céu, a desconformidade dos dias não aproveitados,
dias estranhos, vãos, onde a juventude se esvai no calor de uma manhã,
num sopro, num suspiro de vento...
Consultei então os astros, luzeiros guias da existência,
que também nada me disseram e quietos, solitários, impávidos continuaram
pendurados no amplo espaço
Só a lua, paciente, fitou-me sorridente e, ternamente, pediu-me:
Silêncio!

domingo, 16 de agosto de 2009

CHUVA, CHUVARADA...



Veio. Caiu. Passou.
chuvarada de pensar...
e agora, nova chuva começa...
e vai eu aqui, livre
voando sobre os céus
de minha terra natal
onde bicho fala
e homem rumina
e tempo não dá tempo
no furinho do espaço que sobra
brota semente gente
sol espia amarelado
e nuvem passa, apertado
e tão apertado passa que chora
chão da mente grávido
de novas ideias
e o homem rumina
enquanto bicho fala
e tempo esquece
eta noite fria...
despida de lua
sem pisca-pisca de estrela
pretume de solidão
onde só o vento conversa
monólogo de doido va-rri-do

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

O REI DO TEMPO


Do livro O OFÍCIO DO CONTADOR DE HISTÓRIAS (Gislayne Avelar Matos/Inno Sorsy)

Elas contaram e eu torno a contar...

Era uma vez um viajante que caminhava pelo grande deserto de neve. Tudo era imenso, triste, solitário.
O viajante parou para descansar um pouco à beira do caminho e pensava, exausto: "Devo chegar antes do anoitecer à primeira aldeia deste deserto gelado."
Como se sentia fatigado, fechou os olhos por alguns minutos, mas logo foi despertado por uma voz estranha, um pouco distante, porém, infinitamente penetrante, que lhe disse: "Você está muito cansado. Venha comigo e repouse um instante. Todo viajante descansa em meu palácio."
A voz era de velho muito velho, talvez até mais que centenário ou talvez até mais que milenar... Na verdade, ele não tinha cor nem idade, talvez fosse mais cinza que o céu de inverno ou talvez fosse mais branco que a neve.
O viajante olhou-o atentamente e viu que o velho tinha na testa um magnífico diadema real e, que, apesar da idade, possuía a força e a leveza da juventude.
"Entre em minha casa" continuou o velho "Meu palácio é mais rico e belo que o mais precioso de todos os palácios do mundo. Veja!"
O viajante, impressionado, viu aparecer dele um palácio que parecia de cristal. Através de seus muros transparentes e brilhantes, podiam-se perceber tesouros inesquecíveis, flores de beleza indescritível, pedras preciosas que reluziam em todas as paredes. O palácio cintilava! E o viajante, ainda pasmo, perguntou: "Que riquezas são estas? Poder-se-ia compra o mundo todo com o que possuís, ó Rei!
O velho simplesmente sorriu e respondeu: "É fato, viajante. Aqui há tesouros de tal valor, que poderiam comprar o mundo. Estas flores e estas pedras preciosas que você vê são as únicas verdadeiras riquezas do mundo: são as ideias do mundo. Quando uma ideia já viveu seu tempo, eu a recolho em meu reino. Aqui, ela dorme o sono do gelo, para recuperar o brilho e a beleza que perdeu entre as pessoas. E ela dorme até o momento em que seu destino esteja pronto para novamente se cumprir, até o momento em que uma alma humana deite seu olhar sobre ela com um pouco de amor. Então com o calor da respiração dessa alma, o gelo se derrete e a ideia volta a viver, jovem e cheia de força. E todos no mundo gritam em torno dela: 'Eis uma nova ideia!' Mas estão enganados: a ideia não é nova, ela já existia, entretanto, como seus ancestrais a rejeitaram com desprezo, ela adormeceu no palácio de gelo. Contudo, ai do homem que desperta um ideia forte, será infeliz, uma vez que possuído por ela, jamais será o seu senhor."
"Onde está vosso palácio, Rei? Em que país habita Vossa Majestade? Onde fica o vosso reino?"
Mas o rei tornou a sorrir e nada respondeu.
Tudo ficou cinza diante do viajante, e seus olhos começaram a se esfumar. Ele tornou a perguntar: "Quem sóis vós, ó Rei?"
E de longe, escutou a compreensível resposta: "Eu sou o tempo".
.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

MENOS


Debrucei-me sobre o nada
Vazia de ideias
Dispensei os amores e as dores
E mergulhei em rancores
Que me dilaceraram por dentro e por fora
Contudo, o que senti foi menos intenso
Que em outros tempos
Sentimentos tão banais e irrisórios, que tive vergonha
Mas não chorei nem me arrependi
Deixei a raiva curtir ao sol
Até dela apenas restar a decepção
E a decepção é como uma canoa que deve estar bem atracada
Senão, levada pela correnteza, vai rio abaixo
Pra lugar nenhum

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-MITO DE ORIGEM DOS INDIOS TICUNA

MITO DE ORIGEM DOS INDIOS TICUNA



Assim meu avô ouviu de seu avô que ouviu de seu avô
e assim vou contar:
Escuro, frio e silêncio. O começo de tudo.
Yo’ i e Ypi. cadê a luz?
Acima da árvore gigante.
Samaumeira, wotchine, esconde o mundo
Yo’i e Ypi querem ver o mundo.
Pegaram um caroço de araratucupi e tcha... um buraquinho na negra escuridão
E aí? Yo’i e Ypi? Cadê a luz?
Pra lá da escuridão, pra lá da copa da samaumeira, pelo buraco, dá pra ver
O quê? Yo’i e Ypi
Uma preguiça real que prende o céu com galhos da samaumeira.
Yo’i e Ypi pegaram mais caroços de araratucupi e tcha, tcha, tcha.. olha lá um montão de estrelas, mas nada de luz...
Yo’i e Ypi cadê a luz?
Hum, hum, hum.... os dois irmãos pensando.
Yo’i e Ypi vão derrubar a samaumeira.
Chama, chama, chama todos os bichos pra ajudar
Vem lá macaco e cutia, boto, cobra, veado, tamanduá, jabuti, tracajá...
Não dá, não dá... samaumeira não cai; nem pica-pau consegue por wotchine abaixo.
E agora Yo’i e Ypi?
Hum, hum, hum.... os dois irmãos pensando.
Uma festa, uma festa de casamento
Aicüna, a irmã, será dada a quem fizer preguiça real soltar os galhos que prendem o céu
Nos olhos da preguiça real tem que jogar formigas-de-fogo. Quem vai?
Chegou Taine, um quatipuru bem pequeno, foi, mas no meio do caminho voltou.
Taine, o quatipuruzinho, tentou de novo. Desta vez, chegou. Jogou as formigas nos olhos da preguiça e a preguiça soltou os galhos que prendiam o céu e lá se foi a samaumeira...
Taine casou com Aicüna e do tronco da árvore caída brotou o rio Solimões e dos galhos espalhados, mais rios e muitos igarapés.
***


INDIOS TICUNA: do tronco lingüístico ticuna, segundo o Censo de 1984, se encontra espalhada pelos seguintes municípios do estado do Amazonas: Benjamim Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá, e Santo Antônio do Içá, contando-se hoje a nação, em torno de 23.000 pessoas. Para eles uma árvore não é apenas uma árvore é muito mais é um símbolo da vida, acreditam que numa árvore está contida toda a memória do mundo.
Yo’i, Ypi e Aicüna são os irmãos primordiais, aqueles que através de suas ações, sendo a maior delas a derrubada da samaumeira, darão inicio ao mundo da forma que hoje o
conhecemos.

O LIVRO DAS ÁRVORES, TICUNA

terça-feira, 4 de agosto de 2009

SOPA DE PATO







Versão de uma das mil e uma histórias de Nasrudin


Por Virgínia Allan



Um dia lá bateu a porta da casa do Zé um compadre chegado do interior e para agradá-lo, o compadre lhe trouxe um pato e Zé, muito agradecido, mandou a mulher fazer um pato cozido.
O compadre não demorou em sua visita e logo se foi arrepiando caminho de volta.

No dia seguinte, Zé acordou com novas batidas na porta. Era um amigo do compadre do Zé que tinha lhe trazido o pato.

Zé mandou que entrasse e lhe ofereceu o que comer.

Na manhã seguinte, novas batidas na porta... e novamente na manhã seguinte e outra vez na manhã da manhã seguinte.

A casa do Zé virou restaurante, ponto certo de quem vinha de fora da cidade, sempre um amigo do amigo do compadre do Zé que tinha lhe trazido o pato de presente.

A mulher estava para largar o coitado, pois já não agüentava mais viver na cozinha, quando novas batidas soaram na porta da casa do Zé e o estranho com a cara mais lambida do mundo se apresentou como o amigo do amigo do amigo do seu compadre que tinha lhe trazido o pato.

O Zé se apoquentou, mas mesmo assim mandou entrar o dito cujo. Sentaram-se à mesa e Zé pediu à mulher que lhes trouxesse a sopa.

O visitante já lambia os lábios e esfregava as mãos, pensando na delicia que logo saborearia, porém, mal deu a primeira colherada fez cara de desgosto: “Ó meu amigo, que tipo de sopa é esta? Isso não passa de água quente”.

“Ora, tá reclamando do quê?” disse o Zé tranquilamente. “Essa, meu amigo, é a sopa da sopa da sopa do pato que o meu compadre e parente me trouxe de presente”.

Cantilena do Corvo

EE-SE BLUE HAVEN

Ee-se encontrou Ahemed na saída de Hus. Dirigia-se ela aos campos de refugiados, nos arredores de Palmira, enquanto Ahemed seguia com seu pa...