De vez em quando em sonhos o gato risonho do País das Maravilhas [1] aonde certa vez, enquanto repousava, foi parar a menina Alice, de vez em quando ele aparece e se mete por dentro do buraco e dá-me aquele sorriso, um sorriso grande e iluminado, e assim eu consigo vê-la, apenas por uns instantes, trancada e virada de cabeça para baixo.
As estrelas de minha janela toda azul, pobrezinhas, estão completamente apagadas, sem brilho algum, pois não é fácil viver na mais pura, crua e negra escuridão / solidão; não há brilho que resista, pois buraco negro que se preze, para poder manter sua fama de vilão não pode deixar nada sair de dentro dele, nem mesmo um fiozinho de luz. Em buraco negro, que segundo alguns estudiosos do assunto é tudo, menos um buraco, nada se vê e de lá nada sai.
É uma pena que eu só possa ter uma visão de minha janela toda azul, apenas em sonhos ou em pensamentos, o que vem, enfim, a dar no mesmo. Minha janela toda azul, salpicada de estrelas, inteiramente aberta para a lua, era assim como um porto seguro, minha fonte de inspiração e renovação, minha joia rara guardada no mais recôndito de meu ser, mas, que, entretanto, para o meu desalento, ficou para trás, em uma outra vida, e de vez em quando, no lamento da saudade, volto a rever / viver.
O buraco negro engoliu minha janela toda azul salpicada de estrelas escancarada para a lua arrastando também consigo dias iguais a estes, dias de sol, de chuva, de vento, de céu azul ou cinzento, que, para mim, no entanto, de um jeito ou de outro, foram dias mais felizes, ou talvez, eu, quem sabe, mais jovem e ingênua, tivesse maior capacidade de acreditar em mudanças, sempre para o melhor, que nos são proporcionadas pelo lento / veloz passar do tempo.
Costuma-se dizer que quando “Deus fecha uma porta, abre uma janela”, o meu caso foi o inverso, Ele fechou uma janela... mas, ainda acredito em mudanças, sempre para o melhor, tanto é assim que tento ficar de fora do campo gravitacional do buraco opressor, embora minha capacidade de crença no ser humano tenha diminuído bastante. Mas, afinal, contudo, porém, todavia, deixemos o passado descansar em paz. Nem tudo está perdido e como a esperança é a última que morre vale-nos lembrar que todo buraco negro já teve seus dias de estrela.
[1] Alice no Pais das Maravilhas; livro do autor inglês Lewis Carroll
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