Um corvo, um cobre

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quinta-feira, 1 de maio de 2008


"Um operário parte de um monte de tijolos, sem significação especial senão serem tijolos para - sob a orientação de um construtor que por sua vez segue os cálculos de um engenheiro obediente ao projeto de um arquiteto - levantar uma casa. Um monte de tijolos é um monte de tijolos. Não existe nele beleza específica. Mas uma casa pode ser bela, se o projeto de um bom arquiteto tiver a estruturá-lo os cálculos de um bom engenheiro e a vigilância de um bom construtor no sentido do bom acabamento, por um bom operário, do trabalho em execução. Troquem-se tijolos por palavra, ponha-se o poeta, subjetivamente, na quádrupla função de arquiteto, engenheiro, construtor e operário, e aí tendes o que é poesia". 

(Vinícius de Moraes)

quarta-feira, 30 de abril de 2008

PERFEIÇÃO?!



Minha irmã sempre me diz que eu costumo exigir demais das pessoas e que por isso elas acabam se afastando de mim. Nunca me doeu muito ver as pessoas se afastarem, há não ser aquelas que eu amava, amo, de paixão, mas a essas sempre dei, dou um jeito de trazê-las de volta e se elas voltam é porque estamos unidas por um laço de um sentimento em comum, um laço de amor, amor de verdade. Tenho poucas pessoas em minha vida, mas são pessoas especiais, junto as quais vivi e tenho vivido, todo tipo de situação. Sim, talvez eu exija demais de algumas pessoas, sempre espero não ter que exigir, pois amor a gente dá porque quer dar, porque pode dar, se o mesmo não acontece de volta ai então é que começam as exigências, posto que sentimentos de insegurança, e a sensação de desengano começam a aflorar, minando assim as relações. Banco a chata, a exigente, porque geralmente não quero que esta pessoa se vá; e passo um bom tempo, não muito longo, apenas o suficiente, exigindo de volta tudo o que dei, na mesma medida, mas se ela não pode, não quer ou não tem a mesma capacidade de devolver o que recebeu, é melhor mesmo que se afaste e procure em outra freguesia o seu igual.
Mas, então, podem indagar de mim, não? Quem sou eu para exigir tanto de alguém, afinal, não sou eu também um ser humano tão errático, desprezível e adorável como tantos outros, e, como ser humano, falível, passível de erro? Não temos nós o direito (ou o hábito?) de errar? Não temos nós o direito (ou o hábito) de fazermos nossas escolhas, sejam elas agradáveis ou não?
Sim, concordo plenamente, temos todos os direitos do mundo, inclusive o direito e a obrigação de saber a linha limite onde termina o seu direito e começa o dos outros e, que os outros não tenham que viver sob o jugo da frase “ninguém é obrigado a nada”. Realmente ninguém é obrigado a nada, pois quem ama não se obriga a nada se doa; pois amor é troca, um contínuo dar e receber, porém se não existe ainda esta razão, há de se ter um mínimo de responsabilidade e respeito, o mínimo de caráter já que ser humano que se preze sabe que tem deveres e obrigações; senão para com todos pelos menos com os que estão mais próximos e se tal não fosse viveríamos uma anarquia com todos fazendo o que quisessem a hora que bem quisesse, sem contas a prestar a ninguém.
Em minha opinião, a única exigência que realmente faço e esta começa por mim, é que as pessoas que se aproximam, seja de mim ou uma das outras, é que as pessoas, estas pessoas, sejam somente elas mesmas e assim poderemos fazer nossas escolhas no velho estilo do ame-o ou deixe-o. A pessoa, sendo ela mesma, está nos dando, e se dando, a chance (aos outros, a mim e a ela) de nos aceitarmos mutuamente, com todos os nossos defeitos, medos, e imperfeições. Temos ambas, então, a opção do sim ou do não, de criarmos laços e construirmos passo a passo uma intima relação de amor / amizade / amor...
Quanto à pergunta feita antes de QUEM SOU EU...?! Quem sou...?! Já me fizeram essa pergunta; eu constantemente me faço essa pergunta... Ainda não sei quem sou... sei o que não sou, ou, pelo menos o que não tento ser. Sei apenas, que, como todos, busco uma saída às incertezas da vida, tentando ver e extrair de cada momento a reposta certa para tão enigmática pergunta que sempre vem no sopro do vento. Quem sou...?! Sou um desenho rabiscado; mosaico fragmentado de realidade, talvez sonhada, talvez vivida, mas que, entretanto, está sempre em busca de aperfeiçoar-se. Para alguns, isso pode parecer fora de lugar e acima das ambições humanas, perfeição, aqui, neste mundo, impossível!!! Sei que é impossível, mas nem por isso vou parar na metade do caminho ou retroceder, minha opção é ir em frente, sempre, mesmo que no fim deva estar só. Não sou e nem me sinto melhor que ninguém, somente busco compreender onde estão as falhas, onde estão os erros, para que, dessa forma, tente ser uma pessoa melhor.

terça-feira, 29 de abril de 2008

QUEM CANTA NÃO ASSOBIA


Canto 1
É noite... Debaixo de uma chuva fina, um homem caminha solitário; o guarda-chuva, usado como bengala, vai batendo levemente na calçada. O homem segue contente, assobiando uma canção, cortando desse modo, o silêncio ditado pelos caprichos do tempo.
As pessoas, esquecidas desse ato tão singelo e espontâneo, são surpreendidas na noite molhada e melancólica: “Quem é este, que em horas tão mortas caminha como se estivesse sob o sol? Vai contente da vida, indiferente à chuva ou a qualquer outro tormento. Sim. Caminha pelas ruas vazias como se estivesse caminhando sob o sol, num dia qualquer, assobiando uma canção, imensamente feliz”.
O homem que assobia, está cada vez mais distante e agora mal se ouvem seus passos e o “toc;toc” de seu guarda-chuva na calçada; ouve-se apenas a canção assobiada misturada ao monótono ruído da chuva.
De dentro de seu quarto, em uma das casas desta rua deserta, um menino, ao pé da janela, vê o homem passar. O homem o olha por alguns instantes e, com um sorriso compreensivo e um gesto sutil, lhe diz adeus. O menino volta para a cama e puxa para si os macios lençóis. Sob a escura solidão, com um assobio longo e afinado, ele recomeça a canção.
Canto 2
Era uma vez um menino que vivia a vida a assobiar. Já nascera assim, assobiando. Não pensem que assobiava porque não sabia falar. Ele falava, mas não gostava muito; seu negócio mesmo era assobiar. Tinha alma de passarinho, aquele menino. Assobiava de dia, de tarde, de noite. Era a alegria de uns e o desassossego de outros.
Sua mãe, às vezes, cansada de ouvir tanto assobio, o repreendia: “Ô, menino, em vez de ficar fazendo bico, porque não abre essa boca e canta?”.
E o menino, nem um pouco chateado, apenas respondia: “Ah, mãe, ‘quem canta não assobia’...!” E dando-lhe as costas, lá se ia, todo contente, brincar no jardim.
O menino não tinha muitos amigos, pois os outros garotos não entendiam: por que assobiar, se era bem mais fácil falar? E ele, o menino, nem um pouco chateado, tentava explicar: “Ora, falar todo mundo fala; quero ver é assobiar”. Depois, sacudindo os ombros, deixava a roda e lá se ia, todo lampeiro, assobiando de volta para casa.
Mas era tanto o incômodo e o espanto causado por esse seu jeito peculiar de ser, que o menino começou a achar que havia mesmo algo de errado com ele. De repente, desejou ser como os outros; de repente, queria que o vissem como um garoto “normal”.
Assim, tentou imitá-los, abrindo a boca e falando como todo mundo, porém, nem sempre dava certo: o danado do assobio escapava nos momentos mais inoportunos, e tinha sempre alguém mal-humorado que, xingando e resmungando, mandava-o parar; outros não suportavam nem a sua presença e “delicadamente” pediam-lhe para se retirar. Mas o pior mesmo acontecia quando passava uma moça bonita... um longo “fiuuuuuuuuu fiuuuuuuuuuu” feria profundamente os ouvidos dos mais “sensíveis”, irados com o incrível desrespeito e uma absurda conduta. Por causa disso, cansou de levar cascudo e de ser chamado de tudo, (menos pelo seu nome verdadeiro, é claro); era um tal de bico doce pra cá; flauta ambulante pra lá; curió bom de bico...).
O menino sentia-se confuso, e uma grande sensação de inutilidade dominou-o totalmente. Com os olhos do desencanto, passou a ver seu futuro e um grande temor se apossou de seu coração.
Certa vez, em uma dessas ocasiões em que nada dava certo, o menino sentou-se à sombra de uma árvore, um velho salgueiro chorão, plantada no jardim por seu avô. Lá no alto, um pássaro cantou; o vento passou, mas o menino permaneceu imóvel, contemplando as folhas que caíam. Mansamente rodopiando, ora para cima, ora para baixo, uma dessas folhas veio parar em suas mãos. Ele olhou-a com curiosidade, examinando-a de trás pra frente e de frente pra trás. Seria uma folha igual às outras, se não fosse pelo cheiro delicioso e pelas linhas que formavam um desenho estranho. Inesperadamente, do desenho, saiu uma luz que, girando em círculos, tudo iluminou.
O menino fechou os olhos que haviam começado a arder, ofuscados pela luz, mas, ao tornar a abri-los não viu mais nada, nem a si mesmo. Ele não podia ver, mas seu corpo inteiro brilhava intensamente. Então, o menino, de repente, sentiu-se leve como uma pena. Pairava no ar? Estaria voando... virando pássaro? Ele ouviu uma voz que, a princípio, achou que viesse de alguém que estivesse a poucos passos de distância, mas, na verdade, ela partia das profundezas de sua mente e lhe falava de coisas que ele nunca mais poderia esquecer. A luz girante, num instante apagou-se, e o menino aquietou seu coração. Voltou a enxergar, mas desta vez de uma forma mais perfeita e brilhante. Levantou-se, guardou a folhinha no bolso e voltou a assobiar. Caíra em si; recobrou a alegria e a consciência das coisas e, com o tempo, sem sofrimentos, (para tudo há de se ter equilíbrio), ele aprendeu quando e com quem deveria falar ou assobiar; aprendeu também que a vida é como um desenho que vamos traçando, lentamente, com fios invisíveis.
Os anos passaram e o menino cresceu; virou gente grande, casou, teve filhos e netos e para eles, sempre contava a história da folhinha e de como ela o ajudara a superar suas dificuldades. Só não falava da luz girante e da voz que falara ao pé de seu ouvido. Esta parte da história guardou para si. Também nem precisava. Ele sabia que todos nós, uma vez ou outra, escutamos a tal voz (que alguns chamam de bom senso) e que atendê-la ou ignorá-la é uma decisão que compete a cada um. Ele a atendeu e se deu muito bem. E quando lhe perguntavam onde estava a tal folhinha mágica, ele, assobiando, metia a mão no bolso e pronto! Eis que ela surgia, “novinha em folha”.
Um dia, no outono, às vésperas de completar 100 anos, ele foi dormir e não mais acordou. Em cima do peito, bem junto ao coração, estava a folhinha, que se desfez em pó assim que alguém a segurou. Uma rajada de vento, talvez Zéfiro, o vento do amor, entrou pela janela e, soprando, levou o que ainda restava dela para muito longe, misturando-a com a poeira dos quatro cantos do mundo.
Fato é que a história do menino que gostava de assobiar, com o passar do tempo, se modificou e agora todas contam que certa feita, numa bela tarde de sol; o menino ascendeu aos céus, completamente livre, transformado em passarinho.
Canto 3
Falava-se de um enorme pássaro, cujas asas abertas pairavam soberbas sob o céu. Seu ninho, forrado com as folhas do salgueiro chorão, no alto de um monte inacessível, representava a esperança para os tolos mortais, que na ânsia de alcançá-lo, perdiam-se quase sempre; eles não podiam compreender que, “esperança”, era muito pouco para quem havia sido talhado para a grandeza. Aqueles que tinham a sorte de ouvir seu canto, que soava como o lamento de uma doce flauta, iam além de sua compreensão e a sabedoria tomava lugar em seus corações como uma rainha que retorna ao trono depois de um longo tempo de exílio.
Levado pelo vento, o canto mágico e poderoso, sempre acompanhado pelas folhas do salgueiro, atravessava os céus e os sete oceanos e possuía o dom de despertar a quem estava adormecido. Foi assim que aconteceu com o velho pirata, que após duzentos sonolentos anos acordou bastante faminto. O canto fê-lo lembrar-se de um tesouro que custara muitas vidas pelo caminho. A jornada em sua busca seria comprida e penosa, uma vez que este tesouro se encontrava agora oculto das ambições do mundo, enterrado na ilha mais distante e fantástica que se podia imaginar; e só ele somente ele, sabia que estrada tomar e por onde deveria seguir. Não precisava mais do mapa, pois a folha de salgueiro que acompanhava o canto maravilhoso seria a bússola que lhe guiaria rumo ao seu destino final.
Em certo vilarejo perdido castigado pelo sol, um outro velho, distraído em seu trabalho de lavrador, ouviu o canto e desejou mudar. A melodia era tão linda, que ele, no mesmo instante, resolveu abandonar o campo e perseguir o mais importante: a confecção de um instrumento raro, cujas notas, quando tocadas, fariam balançar os corações mais endurecidos. Antes, isto lhe parecia impossível, mas agora, não. A folha do salgueiro, que viera pousar em seu peito, lhe mostrou um estranho desenho e então ele soube o que era perfeição.
Para os lados onde sopra o frio vento norte, uma nuvem despencou do céu e caiu no mar, e, desta união impensada, nasceu um magnífico animal: um unicórnio mágico, cuja brancura, ao refletir a luz do sol, mostrava a infinita beleza do Universo; sua cauda era uma constelação de estrelas e o seu chifre, sempre apontando para o alto, indicava a presença de um único Deus.
O pobre poeta que não conseguia mais escrever, possuído que estava por uma palavra incompreensível que ouvira certa vez numa rua de Istambul, chorou ao perceber que, subitamente, a palavra que o consumira durante anos, adquiriu significado e a verdade lhe chegou como uma donzela radiante. Então, ele compôs um belo e longo poema, sobre um canto inesquecível e uma folha de salgueiro chorão. O poema era tão belo e distante, que o rei, ao ouvi-lo, mandou que fosse impresso em letras de ouro e espalhado pela cidade. Ficou decretado que todos teriam direito à paz e à celebração do amor e este foi o seu último ato como rei.
Na manhã seguinte um homem nu foi encontrado morto na sala do trono.
Uma mulher grávida sentada perto de uma janela em um fim de tarde, também ouviu cantar o pássaro e desejou que seu menino pudesse entender a sua linguagem. Quando o pequeno nasceu, ela compreendeu que ele teria sabedoria suficiente para adaptar-se ao mundo e não titubear diante das dificuldades, pois ele, de dentro de sua barriga, também o ouvira cantar e sentira em seu rosto o leve roçar da folha do salgueiro que sua querida mãe guardava entre as mãos. Ele falaria e entenderia a linguagem dos pássaros e seria como um rei; seria grande como Salomão, o mais sábio e glorioso de todos os soberanos.
Outras crianças ouviram o pássaro cantar e o seu canto lhes dizia que na solidão de uma noite escura, um menino-rei voou em suas asas, percorrendo, por inteiro, o maravilhoso céu da China, mas eis que uma de suas penas caiu ao chão e desde então, aquele que ouviu dela falar, imaginou um desenho que tomou como verdadeiro em seu coração, portanto não é por acaso que sempre se diz: ‘Busca o conhecimento nem que seja na China’. Porém, o homem foi dominado pelo esquecimento e quanto mais crescia, quanto mais evoluía, mais se esquecia. O desenho impresso em seu coração está agora, quase apagado. Mas dizem, que de tempos em tempos, quando o pássaro canta, os adormecidos; os cansados e os famintos compreendem suas reais necessidades e partem em busca de seu destino, embora saibam bem dentro de seus corações, o quão longa e difícil será a viagem.




segunda-feira, 28 de abril de 2008

REFLEXÕES DE UMA ALIENIGENA SOBRE O INTRIGANTE COMPORTAMENTO DOS SERES HUMANOS PARTE II


Observar os humanos me deixa muito apreensiva e extremamente exausta. Já deveria estar acostumada, mas do meu ponto de vista intergalático, eu, como habitante de um mundo “inexistente” (sim... pois, para os humanos, aquilo que não se vê, ou que não se pode tocar não existe) ouso dizer que os humanos me irritam profundamente com essa mania de se acharem a melhor coisa já feita por Deus neste vasto Universo. São melhores que tudo e em tudo, senhores de uma arrogância tão estúpida quanto inútil. Zombam até mesmo do “trabalho das estrelas”. (Não me peçam para explicar como é feito este trabalho...) Resultado... estou com uma dor de cabeça deveras horrorosa e um desânimo que beira ao desencanto. Desencanto total... com a vida, com as pessoas, de um modo geral. Às vezes, não é sempre, me dói estar viva... me dói estar “presa” a um corpo e a um mundo tão doente... Minha espaçonave está logo ali, pousada no meu quintal... bem ao alcance... estão faltando algumas peças... Saibam... a aterrissagem foi um tanto trabalhosa... todo dia ajeito, mas não sei quando ficará pronta. Bom... de qualquer modo, é fato... estou proibida de abortar a missão... Liberdade de escolha tem seus limites... outros aliens estiveram aqui antes de mim... e outros, certamente virão depois, mas não pensem que sou a única, atualmente, a me remoer com os disparates cometidos pela humanidade, essa “donzela adormecida”, há outros, como eu, espalhados pela superfície do planeta. Vou deixar de lado, no futuro, minhas reclamações... entretanto, hoje, me perdoem... está difícil... acordei com uma sensação de estar sobrando... estou vazia... nada de música, nada de amigos, nada de paixões... é meio estranho me ver de repente como um ser carente, fragilizado... é meio estranho me ver como um desses humanos, que arrastam consigo uma multidão de fantasmas... não quero virar um boneco, uma espécie de Pinóquio E.T.ransformer... esse disfarce de humano me incomoda...a pele me dá alergia... Vou dar um tempo... Vou para a lua, partirei no foguete que já está a  subir.... a fugir pra longe daqui... Haaa... outra vez me perdoem os pensamentos desarrumados... deve ser a atmosfera da terra, tão pesada, que depois de tanto tempo, começa a fazer seus efeitos... só pode ser...

DE CLARICE...



A EXPERIÊNCIA MAIOR: Eu antes tinha querido ser os outros para conhecer o que não era eu. Entendi então que eu já tinha sido os outros e isso era fácil. Minha experiência maior seria ser o âmago dos outros:e o âmago dos outros era eu.

***

ANTES ERA PERFEITO: Ter nascido me estragou a saúde.


***

DESENCONTRO: Eu te dou pão e preferes ouro. Eu te dou ouro mas tua fome legítima é de pão.

***

VIVER: Ele teve a sensação de ser. Não poderia explicar, tão profundo, nítido e largo que era. A sensação de ser era uma visão aguda, calma e instantânea de ser o próprio representante da vida e da morte. Então, ele não quis dormir, para não perder a sensação da vida.

(Do livro Aprendendo a Viver, Crônicas reunidas de Clarice Lispector, 2004,Editora Rocco)

domingo, 27 de abril de 2008

RECORDAÇÕES DA CASA DA COBRA-COBRA NORATO [1]


É noite!
A cidade dorme.
Das profundezas das águas sai Norato,
menino encantado em cobra.
Pelas ruas vazias
passeia feito gente.
Silêncio!
Solidão.
A cidade dorme.
Norato, menino encantado em cobra,
mergulha de volta às profundezas das águas.


***

[1] COBRA NORATO I: Reza uma lenda, de origem portuguesa, que Norato ou Honorato, era um moço belo e sedutor, filho de um português muito rico, dono de uma fazenda no Tocantins para o cultivo do cacau. O rapaz, ambicioso, matou o pai afim de ficar com a fazenda e todos os seus bens. Seduzido pela Iara, foi levado por ela para o fundo das águas, encantando-se em Cobra-Grande ou Cobra-Honorato, e ainda Cobra-Norato.
COBRA NORATO II: A versão indígena das bandas do Pará nos conta que Cobra Norato era filho de uma índia que um dia, ao tomar banho no Paraná do Cachoeiri, ficou grávida de um boto. Nasceu-lhe um casal de gêmeos, Maria Caninana e Norato. As crianças, de estranha aparência, foram abandonadas por sua mãe no rio Tocantins. Maria Caninana era má e ao crescer tornou-se o terror dos viajantes e das gentes de barranco. Norato, não suportando mais tanta perversidade, mata a irmã, passando a viver sozinho nas águas da Amazônia. Dizem que em noite de festa, despe-se da pele de cobra e vai dançar a procurar nos bailes alguém corajoso o bastante que o desencante. 


Do livro MORONETÁ-Crônicas Manauaras, Virgínia Allan; Editora Valer 

sábado, 26 de abril de 2008

CRENÇAS DE CABOCLO


Esta, meu pai nos contava nas noites de chuva, quando amedrontado pelo barulho do rovão, corríamos para a sua cama, expulsando nossa mãe que acabava por dormir na rede. Dizia assim: 

''Caboclo João, um dia cansou da lida dura por dentro daqueles matos. Aquilo não era vida, não! Certa feita, depois de uma briga feia com o regatão (que acabou derrubando no rio e por isso mesmo, o dito cujo jurou vingança) decidiu-se. Iria embora. Partiria já, imediatamente; e sem contar conversa, rumou para casa, na velocidade de um pé de vento. “Mulher, apronta nossas tralhas e pega as crianças. Quero tá bem longe quando a noite cair”.

Maria; era como ela se chamava, sempre pronta a obedecer, fez o que o marido mandava, e a pobre casinha de teto de palha, de portas e janelas pintadas de azul, às margens do rio, lá ficou, sozinha e triste, sem as canções de ninar, que ela, Maria, gostava tanto de cantar; lá ficou, sozinha e triste, sem as travessuras de Tiquinho e Alice. Até o gato, de curiosos olhos amarelos, que não quis acompanhá-los, desapareceu no fundo da mata. Lá se foi caboclo João com a sua Maria, levando pela mão Tiquinho e Alice. Ainda não resolvera para onde ir, porém, iriam mesmo assim. Imprudência? Certamente! Mas, o que caboclo João não podia (e nem devia), era ficar ali, esperando simplesmente a morte chegar. 

A família andou muito, e realmente, já estavam bem longe, quando principiou a escurecer. Por sorte haviam chegado a um lugar agradável, um recanto cheio de flores e frutos bons de se comer. 'É!'... decidiu-se. Dormiriam ali.

Apesar de ter nascido e se criado no mato, caboclo João não era daqueles que acreditavam em seres encantados. Em todos esses anos nunca vira um unzinho só que fosse!

Curupira nunca lhe deu peia, Jurupari, vixe, passava ao léu Boiúna, essa então! Onde já se viu cobra preta sem tamanho, que vira canoa e engole gente!

Maria não acreditava; também não duvidava. Sua experiência lhe dizia que existem tantos mistérios neste mundo que nem valia a pena se preocupar. Não sentia medo, porque João não sentia medo. Eta caboclinho corajoso! Pra ele, não tinha nada nem ninguém.

Ajeitaram o local, fizeram uma rápida refeição e se prepararam para a noite. Tiquinho e Alice, acomodadinhos no colo quente da mamãe, não tinham do que reclamar. Caboclo João cheirando a brisa que vinha do rio e olhando o céu coberto de estrelas, pensou que não existia vida melhor. Logo adormeceu. Maria, pelo sim pelo não, não mirou o céu, pregou sim o olho foi nas crianças, com medo de cobra e formiga de fogo. Entretanto, embora convencida de que precisava ficar de vigia, o sono foi mais forte.

Dormiam confiantes na mão misericordiosa do Todo Poderoso, que não lhes faltara em hora nenhuma. E eis, que no silêncio da noite, não ouviram o apito de um vapor, avisando que estava de partida, não viram o vapor se transformar em tronco e depois virar novamente em uma ilha, e outra vez virar vapor, causando imensos banzeiros e arrepios nas gentes dos barrancos.

Caboclo João não acordou; Maria nem se mexeu; Tiquinho e Alice sonhavam que trepavam na velha goiabeira.

Na manhã seguinte, oh, ingrata surpresa!, após terem percorrido léguas e léguas, haviam voltado para o mesmo lugar de onde saíram, em frente a casinha de teto de palha, às margens do rio, que com suas portas e janelas pintadas de azul, parecia sorrir.

Caboclo João não acreditou; só podia ser um sonho, um sonho mau, pesadelo de Jurupari! Como é que podia, estando naquele pedaço de chão bonito e distante, ver sua casinha tão pertinho. Esfregou os olhos, mas, não adiantou: a imagem permanecia ali. Não tinha jeito. Voltaram para o mesmo lugar. Num repente se deu conta: continuavam com os pés fincados na ilha encantada. Decidiu-se.

“Depressa, mulher, pega as crianças e corre pra casa. Terra firme que nada. Isto é o diacho de uma ilha encantada. Cobra preta que vira bote e engole gente!”... Caboclo João nunca soube explicar o que se deu. O fato é que ele resolveu não se arriscar. Decidido, voltou para casa e agradeceu a Deus a ajuda de sua mão piedosa. Verdade ou mentira! Quem é que sabe? Como dizia caboclo João, melhor não arriscar, pois não é todo dia que se pode escapar da cobra grande.



Do livro Moronetá-Crônicas Manauaras, Virgínia Allan, Editora Valer

Cantilena do Corvo

EE-SE BLUE HAVEN

Ee-se encontrou Ahemed na saída de Hus. Dirigia-se ela aos campos de refugiados, nos arredores de Palmira, enquanto Ahemed seguia com seu pa...